Após o sucesso dos filmes A Menina que Matou os Pais e O Menino que Matou Meus Pais, a série Tremembé retoma a história de Suzane sob uma nova perspectiva

O interesse do público por produções baseadas em crimes reais ganhou novo fôlego no Brasil com a estreia de Tremembé, série do Prime Video. A obra leva às telas o cotidiano da penitenciária que abriga figuras como Suzane von Richthofen, Elize Matsunaga e o casal Nardoni. Ela mistura personagens reais e ficcionais para discutir o peso da fama, da culpa e da exposição midiática.

Diferente dos longas “A Menina que Matou os Pais” (2021) e “O Menino que Matou Meus Pais” (2021), que se concentravam exclusivamente no crime cometido por Suzane, Daniel e Cristian Cravinhos em 2002, Tremembé expande o olhar.

A série propõe uma reflexão mais ampla sobre o sistema prisional e o modo como a sociedade consome histórias de violência. Inspirada nos livros de Ulisses Campbell, “Suzane: Assassina e Manipuladora” e “Elize Matsunaga: A Mulher que Esquartejou o Marido”, a produção combina elementos documentais e ficcionais para explorar o que acontece depois do julgamento.

Carla Diaz - A Menina que Matou os Pais
Carla Diaz como Suzane no filme “A Menina que Matou os Pais” | Foto: Reprodução/IMDB

Suzane von Richthofen: de protagonista a peça de um mosaico criminal

Nos filmes lançados em 2021, Carla Diaz interpretou Suzane von Richthofen em duas versões complementares do mesmo crime. Um sob a ótica da jovem condenada, e outra sob o ponto de vista de Daniel Cravinhos. Essa estrutura dual mostrou como a narrativa pode mudar de acordo com quem a conta, destacando as contradições e ambiguidades do caso.

Em Tremembé, no entanto, Suzane deixa de ser o centro absoluto da história. Ela surge como uma entre várias figuras que dividem a atenção do público. Entre elas estão: Elize Matsunaga, Anna Carolina Jatobá, Alexandre Nardoni, Sandrão, Roger Abdelmassih e outros.

Essa mudança de foco sinaliza uma nova abordagem: em vez de revisitar apenas o crime, a série observa as consequências dele, explorando as dinâmicas de convivência, arrependimento e manipulação entre pessoas que carregam passados semelhantes, mas motivações distintas.

Como Tremembé amplia o universo de Suzane von Richthofen
Marina e Carla como Suzane | Foto: Prime Vídeo/Reprodução

Duas Suzanes, dois tempos: da manipulação à consequência

A trajetória de Suzane von Richthofen nas telas ganha novas camadas quando se observa a distância entre as interpretações de Carla Diaz e Marina Ruy Barbosa. Nos primeiros filmes, Carla encarna uma Suzane jovem, envolta na intensidade do crime e na disputa de versões que cercaram o caso.

Sua interpretação traduz o momento do acontecimento: uma personagem impulsiva, contraditória e emocionalmente carregada, cuja histeria e manipulação revelam o impacto imediato de um ato brutal ainda sem distância temporal.

Já em Tremembé, Marina Ruy Barbosa dá vida a uma Suzane marcada pelo tempo e pela prisão. Agora mais contida, sua personagem vive as consequências de seus atos e enfrenta um cotidiano que mistura uma mulher calculista e que busca a sobrevivência.

Além disso, a frieza da nova Suzane não é apenas resultado dos anos passados. Ela também reflete a percepção de que, mesmo atrás das grades, continua sendo observada, julgada e reinterpretada pelo público.

Essa diferença entre as duas versões reflete o amadurecimento da própria narrativa sobre Suzane, e em certa medida, do público. A trilogia estrelada por Carla Diaz mergulhava na emoção do crime e na dúvida moral. Já Tremembé desloca o foco para o que vem depois, quando o espetáculo da mídia se dissolve e resta apenas o cotidiano do cárcere.

Assim, a Suzane de Marina não repete a de Carla: ela a completa, mostrando que o interesse do audiovisual brasileiro sobre o caso não está mais no “por que ela fez”, mas no “o que restou depois”.

Tremembé amplia o universo de Suzane von Richthofen
Marina Ruy Barbosa e Letícia Rodrigues na série | Foto: Prime Video/Divulgação

O fascínio do público pelo true crime brasileiro

O sucesso de “A Menina que Matou os Pais” e “O Menino que Matou Meus Pais” abriu caminho para uma nova fase do true crime nacional. Essas produções mostraram que há interesse não apenas pelos fatos, mas também pelas interpretações e pelas versões que competem entre si. Tremembé surge, portanto, como um desdobramento natural desse fenômeno, deslocando o foco do ato criminoso para as suas consequências sociais, psicológicas e midiáticas.

Mais do que revisitar histórias conhecidas, a série propõe discutir o papel do público como espectador do crime, e até como parte do espetáculo. Além disso, o presídio de Tremembé, transformado em cenário central, funciona como um espelho da sociedade. É um espaço onde convivem a culpa e o julgamento. Também é onde se revela o desejo coletivo de compreender, ou condenar, aqueles que ganharam notoriedade por seus delitos.

Ao reunir nomes marcantes do noticiário policial em um mesmo universo ficcional, Tremembé não apenas amplia o debate iniciado pelos filmes sobre Suzane von Richthofen, mas também reforça uma questão ética que acompanha o gênero: até que ponto o entretenimento pode (ou deve) se alimentar do crime real?

Imagem de capa: Prime Video/Divulgação