Quando um novo filme de terror com bonecas aparece, é quase impossível não pensar em Annabelle, M3GAN ou até mesmo Chucky. Mas quem conhece o terror japonês sabe que ele tem um talento raro: transformar o banal em pesadelo. Foi assim com O Chamado, que fez uma simples fita VHS se tornar objeto de pavor, e com O Grito, que transformou uma casa comum em um abismo de dor e rancor. Dollhouse (ou A Boneca da Casa), dirigido por Shinobu Yaguchi, segue essa linhagem, mas escolhe um símbolo ainda mais delicado: uma boneca. Um brinquedo aparentemente inofensivo que aqui se torna reflexo da perda, da culpa e da insanidade.
A dor que toma forma e o luto como maldição

A história acompanha Yoshie, uma mãe devastada pela morte da filha, Mei. Em um impulso quase inconsciente, ela compra em um mercado de antiguidades uma boneca idêntica à menina falecida.
O gesto de consolo logo se transforma em obsessão. Quando Yoshie tem outra filha, Mai, e tenta seguir em frente, a boneca, agora chamada Aya, retorna, trazendo consigo um terror silencioso que se infiltra na rotina familiar como um veneno lento.
Dollhouse não é apenas um filme sobre bonecas amaldiçoadas. É, antes de tudo, um retrato psicológico da perda e da recusa em deixá-la partir. A boneca não é um instrumento do mal, mas o espelho de uma dor não resolvida. O amor corrompido pela culpa se transforma em uma força monstruosa, e Yaguchi filma isso com uma sensibilidade fria e poética.
O diretor entende que o verdadeiro terror não vem dos gritos, mas das pausas. Cada olhar vazio da boneca, cada respiração trêmula da mãe, cada ruído distante parece gritar algo que não pode ser dito. A estética lembra O Chamado e O Grito, mas com um tom mais melancólico, quase contemplativo. O horror aqui é introspectivo, mais sobre o que não é mostrado do que sobre o que é visto. O roteiro é bem construído, e em certos momentos surpreende por não seguir um caminho seguro.
Ritmo, Referências e Fotografia
Em certos momentos, Dollhouse flerta com o grotesco simbólico de Annabelle, mas sem cair na armadilha hollywoodiana do susto previsível. O mal aqui não é uma entidade demoníaca, e sim a própria materialização do trauma. Há também ecos de O Telefone Preto, na forma como o filme transforma objetos comuns em portais para o medo. Assim como o telefone de Derrickson é uma ponte com os mortos, a boneca de Yaguchi é uma ligação direta com o passado e o preço dessa chamada é altíssimo. E quando o roteiro leva Yoshie até uma ilha que só pode ser acessada quando a maré abaixa, a lembrança de A Mulher de Preto é inevitável.
Há momentos em que Dollhouse se alonga demais, repetindo imagens e silêncios que poderiam ter mais impacto se fossem dosados com parcimônia. Mesmo assim, o desconforto nunca desaparece. É o tipo de terror que não te dá sustos, mas te assombra quando você apaga a luz. Além disso, é um filme de terror que passa em sua maior parte em cenários urbanos, coloridos, fugindo da questão noturna e ambientes escuros.

Vale a pena assistir Dollhouse?
Dollhouse é um terror elegante, sufocante e emocionalmente devastador. Não quer te assustar com gritos, mas com memórias, e consegue. É um filme forte, com uma história envolvente, rodeada com um mistério antigo e com um final que deixa brechas para uma continuação.
Dollhouse está em cartaz em alguns cinemas no Brasil.
Crédito da capa: Toho / Divulgação
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