Chega aos cinemas a cinebiografia de Maurício de Sousa, um dos maiores ícones da arte e dos quadrinhos mundiais, criador da Turma da Mônica, uma das HQs mais lidas do Brasil. O filme busca lançar luz sobre a história ainda pouco conhecida do quadrinista, ilustrador e jornalista que transformou sua imaginação em um universo inteiro de personagens e afeto.

A direção e a proposta do filme vão além do que a gente espera, e isso é bom!

Com direção de Pedro Vasconcelos, conhecido por filmes como Fala Sério, Mãe! e novelas como Espelho da Vida, o longa retrata como a perseverança e a busca pelo sucesso podem acontecer de maneiras diferentes na vida de cada pessoa. Muitos fãs da Turma da Mônica não fazem ideia de como seus personagens nasceram. Embora muitos saibam que os nomes vieram dos filhos de Maurício, a história não começa dessa forma. Antes de se tornar quadrinista, ele tentou imaginar outros caminhos para sua vida. Incentivado pelo pai, pela mãe e principalmente pela avó, o jovem Maurício deixa sua cidade natal e parte para São Paulo em busca de uma vaga como colunista ou ilustrador nas redações jornalísticas.

A jornada, no entanto, não foi fácil. Ele recebeu vários “nãos”, trabalhou como jornalista investigativo policial, área distante de seus sonhos, mas que lhe deu a chance de estar dentro do jornal e, quem sabe, mostrar seus desenhos a alguém que reconhecesse seu talento.

Elenco vai além do óbvio ao trazer a família para dentro da tela

Um dos pontos mais curiosos e emocionantes é a escolha de Mauro Sousa, filho de Maurício, para interpretar o pai nas versões jovem e adulta. Essa decisão traz uma harmonia e uma carga sentimental muito fortes para o filme, refletindo a essência das próprias obras de Maurício, marcadas por família, afeto e sensibilidade. O ator mirim Diego Laumar, que vive o personagem na infância, também entrega uma atuação encantadora.

O elenco conta ainda com Thati Lopes como Marilene, a primeira esposa de Maurício, Elizabeth Savalla no papel da vó Dita e Othon Bastos completando o time. Todos contribuem para o tom emocional e familiar que o longa busca alcançar.

Mauricio de Sousa - O Filme, de Pedro Vasconcelos
Mauro Sousa interpreta Mauricio de Sousa. Crédito: Vantoen Pereira Jr.

Uma narrativa contada pelo próprio criador

O roteiro apresenta uma escolha narrativa peculiar: toda a história é narrada pelo personagem principal, como se ele estivesse contando mais uma de suas histórias. Essa decisão faz total sentido, afinal, ele é um contador de histórias por natureza. Em muitos momentos, essa narração funciona lindamente, reforçando o tom biográfico e íntimo. Em outros, porém, quebra um pouco o ritmo, surgindo em passagens que talvez pedissem mais atuação e menos explicação. Ainda assim, o formato contribui para o caráter pessoal do filme, que em linhas gerais é envolvente e afetuoso.

Mas o roteiro traz outros encantos, como dar luz a amizade e cumplicidade que existia entre Mauricio e Ziraldo, outro ícone dos quadrinhos brasileiro. Foi um momento muito “hollywoodiano”, em que dois heróis de mundos diferentes se encontram.

Entre acertos e ausências, o roteiro não tenta ser cópia das obras, e isso não é bom

Comparado aos filmes inspirados em suas criações, como Turma da Mônica: Laços e Chico Bento e a Goiabeira Maraviosa, este longa é menos impactante e mais contido. Fiquei um pouco decepcionado com alguns aspectos narrativos, especialmente porque senti falta de um toque mais lúdico ou elaborado, algo que remetesse ao universo colorido e sonhador dos quadrinhos. Por ser a história de um quadrinista que fala sobre infância e imaginação, o filme poderia ter ousado mais nesse sentido. Em alguns momentos, a cinebiografia se torna excessivamente explicativa, descrevendo fatos em vez de vivê-los na tela.

Mesmo assim, a segunda metade da obra acerta em cheio. A direção encontra um ritmo mais sensível e envolvente, e a emoção finalmente floresce. A fotografia, por sua vez, é um dos grandes acertos: Vasconcelos aposta em planos estáticos, closes e enquadramentos que lembram páginas de revistas em quadrinhos, criando uma estética visual coerente e poética.

Mauricio de Sousa - O Filme, de Pedro Vasconcelos
Mauro Sousa interpreta Mauricio de Sousa. Crédito: Vantoen Pereira Jr.

Homenagem justa e necessária

No fim das contas, o filme vale muito a pena ser visto no cinema. É uma produção de ponta que conta a história de uma das pessoas mais importantes da cultura brasileira. Como espectadores, é um privilégio conhecer um pouco da trajetória de Maurício de Sousa para além das páginas coloridas. É essencial que homenagens assim aconteçam enquanto nossos ídolos estão vivos, e essa é, sem dúvida, uma das mais justas e bonitas.

Maurício de Sousa construiu sua vida degrau a degrau, enfrentando dificuldades, rejeições e dúvidas, mas sem perder o olhar sonhador que o caracteriza. Curiosamente, o filme me lembrou Dois Filhos de Francisco, tanto pelo espírito de persistência quanto pela sensibilidade em retratar a busca pelo sonho. Assim como aquele clássico, este também deve emocionar o público e inspirar novas gerações de leitores e artistas.

Produzido pela Disney, o longa é um tributo sincero a um homem que ajudou a formar a imaginação de milhões de brasileiros. É também uma oportunidade para as crianças conhecerem o nome por trás da Turma da Mônica e se encantarem com suas histórias de um jeito novo. Maurício de Sousa, com toda sua trajetória, representa a essência do artista brasileiro: sonhador, teimoso, criativo e apaixonado. Sua história é a de todos que ousaram acreditar que desenhar um sonho também é uma forma de mudar o mundo.

Crédito da capa: Divulgação Disney / Star Plus | Crédito: Vantoen Pereira Jr.