Após o Oscar de Ainda Estou Aqui após uma campanha e temporada de premiações que mobilizaram todo o país, era inevitável que as atenções do cinema nacional não se voltassem para Vitória, estrelado por Fernanda Montenegro. O novo filme da Globoplay dirigido por Andrucha Waddington – que, para quem não sabe, é marido de Fernanda Torres – estreia dia 13 de março nos cinemas brasileiros.
O filme é inspirado na história real de uma senhora que vivia em meio aos tiroteios e balas perdidas de uma comunidade do Rio de Janeiro, até que decidiu comprar uma câmera para registrar provas contra o crime organizado após ter sua ajuda negada pela polícia diversas vezes. As filmagens acabam nas mãos de um repórter policial que decide a ajudar a expor a situação. Porém, a investigação colocaria a sua vida em risco, então ela precisa entrar no Programa de Proteção a Testemunha e mudar de identidade para sempre.

Vale ressaltar que a identidade real dessa mulher só foi revelada em 2023, quando o filme já estava gravado. Nina, interpretada por Fernanda Montenegro, na verdade, era Joana da Paz. Já Fábio Godoy, personagem de Alan Rocha no filme, retrata o jornalista Fábio Gusmão da vida real, que escreveu o livro ‘Dona Vitória Joana da Paz’, que inspirou o roteiro de Paula Fiuza e Breno Silveira, diretor que faleceu ainda no início da produção.
Dizer que a atuação de Fernanda Montenegro é excepcional chega a ser redundante, porém, é impossível falar de Vitória sem destacar sua protagonista. Similar à própria dona Nina, que em momento algum demonstra sentir limitações devido a sua idade, a atriz carrega o filme e mostra, mais uma vez, porque é um dos maiores nomes do cinema nacional, no auge de seus 95 anos.

“Vocês querem me matar pra eu não morrer?” diz Nina em uma das cenas mais marcantes do filme. Com uma direção sensível e performances irretocáveis, especialmente de Montenegro e Alan Rocha, Vitória é um retrato angustiante da realidade das periferias brasileiras.
O roteiro emociona, especialmente por ser baseado em acontecimentos reais, mas deixa a sensação de que algumas temáticas poderiam ser mais aprofundadas, como, por exemplo, as problemáticas envolvendo o personagem Marcinho, interpretado pelo talentosíssimo ator mirim Thawan Lucas, ou até mesmo a própria investigação e exposição jornalística do caso. A impressão que fica é que é uma história com muitas nuances, mas nem todas foram tão bem exploradas quanto poderiam.
Em contrapartida, um grande ponto de destaque do filme é sua fotografia. Quando assistimos os acontecimentos gravados por Nina através das lentes de sua filmadora, sentimos o peso do lembrete de que essa é a realidade de muitas periferias brasileiras, e somos ainda mais impactados pelas cenas presenciadas pela protagonista.

Uma questão complexa que gerou alguns questionamentos por parte do público é o fato de que Joana da Paz era uma mulher negra, e foi representada no filme por uma atriz branca. Isso porque, quando o projeto começou a ser filmado, Joana ainda estava viva e jurada de morte. Por isso, a produção optou por escalar uma atriz com características físicas diferentes da Joana da vida real.
Da mesma forma, Fábio Gusmão, que é um homem branco na vida real, foi interpretado no filme por Alan Rocha, um ator negro. Em entrevista, Gusmão afirmou que Joana era “apaixonada” por Fernanda Montenegro e aprovou sua escalação. No entanto, ela acabou falecendo antes do lançamento do filme, e só então sua identidade foi revelada ao público.
Vitória conta uma história que merece muito ser contada. Potencializado pelo trabalho de Fernanda Montenegro, o projeto certamente não teria o mesmo impacto sem ela. No fim, é um filme que comove, indigna e inspira com muita sensibilidade.
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