Poucas histórias nasceram de forma tão sombria quanto “Frankenstein”. Criado em uma noite de tempestade, o romance que redefiniu o terror e inaugurou a ficção científica surgiu da mente de uma jovem cercada por perdas, medo e genialidade. Aos 18 anos, Mary Shelley transformou um pesadelo em uma das obras mais duradouras da literatura. Uma história sobre vida, morte e os limites do poder humano. Mas antes de dar vida à sua criatura, ela mesma precisou desafiar as convenções e sobreviver às tragédias que moldaram sua existência.
Nascida em Londres em 1797, Mary Shelley era filha de dois pensadores revolucionários. Sua mãe, Mary Wollstonecraft, foi uma das primeiras feministas da história, autora de “Reivindicação dos Direitos da Mulher“. Seu pai, William Godwin, era filósofo e defensor do pensamento racional e das ideias anarquistas. A vida de Mary foi marcada pela tragédia desde o início. Ela nunca conheceu a mãe, que morreu poucos dias após o parto.
Mary e Percy Shelley
Aos dezesseis anos, Mary conheceu o poeta Percy Bysshe Shelley, então com 21 anos. Idealista, ateu e defensor do amor livre, ele era um discípulo do pai de Mary e também um homem casado. A paixão entre os dois foi imediata e escandalosa. Fugiram juntos pela Europa acompanhados da meia-irmã de Mary, Claire Clairmont, vivendo meses de pobreza e rejeição social.
Quando retornaram à Inglaterra, Mary estava grávida. O bebê, no entanto, morreu poucos dias após o nascimento, um trauma que ecoaria para sempre em sua obra. Após o suicídio da esposa de Percy, o casal pôde finalmente se casar, em 1816. Ainda assim, a relação foi marcada por infidelidades, perdas e solidão. Dos quatro filhos que tiveram, apenas um sobreviveu à infância. Em 1822, Percy morreu afogado durante uma tempestade na Itália. Quando o corpo foi cremado, o coração do poeta não queimou completamente e Mary o guardou consigo até o fim da vida.
O verão sem sol
Mas o legado de Mary Shelley começou antes dessa tragédia final. Em 1816, o casal viajou para a Suíça e hospedou-se às margens do Lago de Genebra, na casa do poeta Lord Byron. O grupo de convidados incluía Byron, o médico John Polidori (autor de “O Vampiro“, precursor de Drácula) e Claire Clairmont.
Aquele ano ficou conhecido como “o ano sem verão”. Uma erupção vulcânica na Indonésia havia escurecido o céu da Europa, provocando meses de frio e tempestades. Presos dentro da casa, os amigos passavam as noites lendo histórias de fantasmas alemãs. Foi então que Byron propôs um desafio: cada um deles deveria escrever uma história de terror.

O sonho que mudou a literatura
Mary passou dias sem inspiração. Até que, certa madrugada, depois de ouvir uma conversa sobre experimentos de galvanismo, tentativas científicas de reanimar tecidos mortos com eletricidade, teve um sonho. Ela viu um estudante curvado sobre um corpo inerte, e, quando a criatura abriu os olhos, o criador recuou em pavor diante do que havia feito. Mary acordou apavorada e, na manhã seguinte, começou a escrever.
A partir daquele sonho nasceu “Frankenstein“, ou o “Moderno Prometeu”, publicado em 1818, quando ela tinha apenas 20 anos. O livro saiu anonimamente, com prefácio de Percy Shelley, porque uma mulher escrever algo tão sombrio e complexo era inconcebível para a época. Somente em 1823 o nome de Mary apareceu na capa.
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O legado de “Frankenstein“
O romance narra a história de Victor Frankenstein, um cientista então obcecado em desafiar a morte. Ao criar vida artificial, ele se depara com as consequências devastadoras de sua própria ambição. Mais do que um conto de terror, “Frankenstein” é uma reflexão sobre solidão, rejeição, poder e responsabilidade científica. Temas que permanecem atuais dois séculos depois. Assim, Mary Shelley criou o primeiro romance de ficção científica da história, influenciando escritores, cineastas e pensadores em todo o mundo.
Nascido de um pesadelo e de um mundo coberto por tempestades, “Frankenstein” permanece vivo. Um lembrete de que os monstros, às vezes, são obra das nossas próprias experiências.
Imagem de capa: Reprodução
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