Aline Bei é considerada uma das vozes atuais mais marcantes do cenário literário nacional

Entre os apaixonados pela literatura brasileira, os livros de Aline Bei estão frequentemente presentes em suas listas de leituras imperdíveis. A autora vem ganhando espaço no coração dos leitores desde “O Peso do Pássaro Morto”, seu romance de estreia.

Aline conquistou os brasileiros com sua maneira singular de dar corpo às palavras. Além disso, os leitores também elogiam bastante seu relacionamento acessível com os fãs.

A paulistana, que se considera uma ativista da literatura, já afirmou em entrevista ao UOL como foi importante criar essa ponte de comunicação entre ela e os leitores:

Eu já vendi exemplares para pessoas que falaram que aquele era o primeiro livro que lia. Ler literatura é importante para despertar empatia, despertar sensibilidade. É muito lindo o quanto a literatura pode ajudar a gente a ser mais sensível, entrar no mundo do outro, ter mais empatia. Eu acho que é isso que o mundo precisa.

Aline Bei leva experiência dos palcos para suas páginas 

Aline Bei em Autoras em cena, projeto do Itaú Cultural, em 2013.
Crédito: Reprodução/Itaú Cultural
Escritora participou do projeto “Autoras em Cena” do Itaú Cultural
Crédito: Reprodução/Itaú Cultural

Antes de estrear no universo literário, Bei se formou em Artes Cênicas pelo Teatro-Escola Célia Helena. Suas experiências nos palcos continuam refletindo nas obras, de modo que a autora já ressaltou em diversas entrevistas o quanto esse período foi importante para sua trajetória literária.

Ainda assim, bem antes de adentrar o mundo artístico por meio do teatro, Aline Bei já nutria paixão pelos livros desde sua infância. Seu amor pela literatura é de longa data.

Em 2024, no quadro “Segundas intenções” da Biblioteca de São Paulo, a autora contou que não veio de uma família de leitores. Dessa forma, suas primeiras memórias literárias pertencem à biblioteca da escola onde estudava:

Embora no meu tempo ela fosse um lugar bastante silencioso porque ainda não tinha os saraus, oficinas e eventos culturais, e nem era tomada pelas vozes e corpos como é hoje, a gente tinha liberdade e autonomia para percorrer as prateleiras para encontrar livros e levar emprestado para casa. Minha mãe lia para mim e às vezes eu lia para ela.

Atualmente, a autora é formada em letras pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e pós-graduada em escritas performáticas pela PUC-Rio.

Entenda o universo literário de Aline Bei

Obras de Aline Bei 
Crédito: Companhia das Letras
Capas do conjunto de obras que formam a “Trilogia Involuntária”, de Aline Bei
Crédito: Companhia das Letras

Nas obras de Bei, o leitor encontra um universo singular. Isto é, sua escrita é uma prosa poética, muitas vezes fragmentada, que não só dá ritmo à narrativa, mas também intensidade. 

A autora recorre a quebras de linha e repetições, além de uso expressivo da pontuação e de palavras em caixa alta. Assim, seus livros se aproximam da poesia, apesar de não deixarem de ser narrativos, já que apresentam personagens, desenvolvimento de enredo e passagem de tempo.

Antes de publicar seu primeiro livro, Aline chegou a receber a proposta de uma editora para transformar a obra em uma narrativa convencional. A autora, no entanto, recusou. A decisão acabou definindo o estilo que marcaria sua estreia na literatura brasileira.

O voo de “O Peso do Pássaro Morto”

Publicado em 2017 pela editora Nós, “O Peso do Pássaro Mortomarcou a estreia literária de Aline Bei e conquistou leitores ao redor do Brasil com sua singularidade. O romance acompanha a vida de uma mulher dos 8 aos 52 anos, abordando perdas, amadurecimento e a construção da identidade.

No início, a divulgação do livro foi feita de maneira bastante independente. Bei apostou no boca a boca, nas redes sociais e na venda direta para que sua obra alcançasse leitores. Foi assim, de pouco a pouco, que a autora construiu uma comunicação sincera com seus leitores.

Muitos se tornaram fiéis ao seu trabalho e acompanham até hoje o lançamento de suas obras. Oito anos depois do lançamento, o livro ganhou uma nova edição pela editora Companhia das Letras.

Além do sucesso, “O Peso do Pássaro Morto” também foi prestigiado em premiações, como o São Paulo de Literatura e o prêmio Toca. Em 2020, a obra ganhou uma adaptação para o teatro. A peça estreou em versão online durante a quarentena e, posteriormente, seguiu em circulação pelos palcos ao redor do país.

As mulheres na escrita de Aline Bei

No universo literário de Aline Bei, as mulheres estão no centro do enredo narrativo. Contudo, é a maneira como as personagens são retratadas que torna suas obras ainda mais especiais.

Desde “O Peso do Pássaro Morto”, a autora acompanha protagonistas que carregam perdas, abandonos, traumas e expectativas sociais desde a infância. De modo que as histórias desenvolvem como essas experiências moldam a vida feminina.

Além disso, Bei defende que, vivendo em um mundo extremamente machista, as dores das mulheres acabam sendo ainda maiores. Em entrevista ao UOL, quando questionada sobre o feminismo como inspiração, a autora afirmou:

Ser mulher é um dos meus assuntos, então eu gosto muito de ouvir as outras mulheres, gosto muito de observá-las no mundo. O feminismo está muito conectado a isso. […] Eu acho lindo esse movimento de várias pessoas se juntando para trazer a mulher pra pauta e pro protagonismo que ela merece.

Entretanto, as obras não se limitam a expor apenas a dor feminina. Nas páginas, os leitores também observam como essas mulheres enfrentam e encontram formas de existir apesar das ausências.

Para Aline Bei, escrever sobre essas experiências é uma forma de dar voz para mulheres cujas histórias são silenciadas. Dessa forma, cada livro se torna único e intimamente humano.

Aline Bei se inspira em grandes nomes femininos da literatura 

A paulistana construiu sua escrita a partir de um repertório diverso de referências literárias e artísticas. Na literatura, ela se inspira em autores como Clarice Lispector, Hilda Hilst, Lygia Fagundes Telles e João Anzanello Carrascoza – este último especialmente marcante em “O Peso do Pássaro Morto”, obra em que ecoa o livro Aos 7 e aos 40 do autor, como Aline relatou em uma entrevista ao Globo em 2018.

Essa base de referências se materializa também nos livros que sucederam sua estreia, formando a Trilogia Involuntária.

Em Pequena Coreografia do Adeus (2021), o leitor mergulha na vida de Júlia, uma menina marcada pelo abandono dos pais, e explora a construção da identidade a partir das feridas familiares. O livro se tornou finalista do Prêmio Jabuti.

Já em sua obra mais recente, Uma Delicada Coleção de Ausências (2025), Aline experimenta novas formas de narrativas. Pela primeira vez, a autora conta a história em terceira pessoa.

O livro acompanha quatro gerações de mulheres de uma mesma família. Avó, filha, neta e bisavó partilham não apenas a casa, mas também os silêncios, abusos e abandonos que atravessam as suas histórias. Confira um trecho:

quando o circo chegou à cidade, aquele pedaço de terra batida onde levantaram a lona finalmente ganhou seu segredo. noite após noite se manteve iluminado, e parecia tão natural naquela paisagem que é como se tivesse crescido depois da chuva, e circo fosse árvore ou coisa que vem da terra.

Imagem de capa: Isadora Arruda