A segunda temporada de Sandman chegou como um sonho breve e arrebatador: belo, tocante, mas interrompido justo quando começava a ganhar força total.

Baseada na obra-prima de Neil Gaiman, a série manteve seu padrão visual deslumbrante e uma narrativa densa, filosófica e emocional. A ambientação onírica continua sendo um espetáculo à parte, seja no Sonhar, no Inferno ou em reinos recém-apresentados como o Reino das Fadas ou as complexidades familiares dos Perpétuos.

A história da 2ª temporada

Netflix lança a segunda temporada de Sandman
Foto: Netflix/Divulgação

Volume 1

No Volume 1, que estreou em 3 de julho de 2025, Morpheus (Tom Sturridge) retorna ao Sonhar com a missão de reconstruir seu reino e enfrentar decisões que ele há muito evitou. Chamado por seu irmão Destino, ele reúne os Perpétuos (Morte, Desejo, Desespero e Delírio) para um encontro familiar carregado de tensões antecipatórias.

Uma profecia das Bondosas anuncia um período de caos iminente, impulsionando Sonho a enfrentar seus erros do passado, especialmente envolvendo Nada, a rainha mortal com quem se relacionou séculos antes. Após concluir que deve trazê-la de volta, ele desce ao Inferno, onde Lucifer (Gwendoline Christie) abdica e lhe entrega a chave do reino infernal, desencadeando uma disputa cósmica por esse poder.

Com o Inferno em suas mãos, Sonho enfrenta diversas investidas de entidades míticas, como Odin, Loki, Thor, os próprios demônios, dentre outros, que buscam assumir o controle da chave. Sonho liberta Nada, entretanto, ela vai para o mundo terreno e pede para ser deixada em paz, recusando qualquer reconciliação romântica.

Enquanto isso, Sonho embarca em uma jornada com sua irmã Delírio à procura do irmão desaparecido, Destruição. Essa busca revela decisões profundas sobre a responsabilidade dos Perpétuos e, eventualmente, leva ao confronto com seu filho Orpheus, resultando numa escolha que desafia a lei de sua família e abre caminho para consequências devastadoras.

Volume 2

Já no Volume 2, lançada em 24 de julho, Sonho enfrenta as repercussões de suas ações e testemunha o despertar de uma força vingativa: As Fúrias, também conhecidas como Bondosas. Sentindo que Sonho violou o código dos Perpétuos ao derramar sangue familiar, elas o forçam a encarar seu destino. Aceitando o inevitável, ele se sacrifica, permitindo Daniel Hall (Jacob Anderson), assuma o título de novo Lorde dos Sonhos. A temporada se encerra com seu funeral, uma espécie de cena de passagem entre gerações dos Perpétuos.

Direção, roteiro e adaptação

Sandman Os perpetuos
Os Perpétuos. Imagem: Divulgação

Visualmente, a produção impressiona com cenários conscientes de sonhos e pesadelos, o design de locações, efeitos visuais e composições fotográficas continuam tão estimulantes quanto na primeira temporada. No entanto, a ambição narrativa às vezes pesa demais: a trama central de Morpheus às vezes dilui os arcos paralelos, resultando em episódios que parecem fragmentados e com foco disperso.

O roteiro, escrito por Allan Heinberg, David Goyer e Neil Gaiman, busca alinhavar as tramas dos irmãos Perpétuos, mas acaba comprometendo o tom autoral do criador. A temporada falha em capturar a voz poético-filosófica que marcou a versão original: Gaiman parece menos presente, e muitos diálogos soam excessivamente melancólicos ou carregados para o emocional, sem a leveza esperada. Assim, enquanto a primeira temporada equilibrava bem o texto literário com a linguagem audiovisual, a segunda perde esse equilíbrio. Alguns episódios são mais emotivos do que verdadeiramente filosóficos, o que distancia a série do espírito original da obra.

Um dos principais problemas da segunda temporada de Sandman é seu ritmo irregular. A narrativa apresenta episódios que soam desconectados entre si, com histórias secundárias que surgem do nada e desaparecem sem amarrar os arcos principais. Em vez de construir uma progressão coesa, a temporada acaba tropeçando em sua própria estrutura, o que pode frustrar quem esperava um fio narrativo mais claro.

Outro ponto que pesa é o tom excessivamente sombrio adotado ao longo da temporada. Embora a melancolia seja parte do universo de Sandman, a série acaba sendo melancólica demais. Com isso, a série perde momentos de leveza, ironia e até do humor peculiar que sempre caracterizou os Perpétuos nos quadrinhos. O resultado é uma atmosfera carregada demais, que deixa pouco espaço para o charme excêntrico que tornou os Perpétuos tão amados nas HQs.

Elenco

Sandman Lucifer
Gwendoline Christie como Lúcifer. Imagem: Reprodução

Tom Sturridge segue entregando uma performance maravillhosa, quase sussurrada, o que dá peso e melancolia a Morpheus. Ele continua sendo o centro emocional da série. Kirby Howell‑Baptiste (Morte), Mason Alexander Park (Desejo) e Esmé Creed‑Miles (Delírio) brilham com energia, profundidade e contraste emocional, especialmente quando o foco se desvia do Sonho para outros personagens.

Além disso, temos o relacionamento de Johanna Constantine (Jenna Coleman) e o Corinthian (Boyd Holbrook). Certamente esse relacionamento foi uma adição narrativa engenhosa e funcionou bem dramaticamente. Os personagens possuem uma química inesperada e uma dinâmica peculiar.

Destaque de honra para Gwendoline Christie. Ela trouxe uma versão de Lúcifer imponente, medonha e ao mesmo tempo angelical. Já Jacob Anderson (Game of Thrones), embora tenha pouco tempo de tela, trouxe uma nova versão do Sonho. Algo puro e com todo o conhecimento de Morpheus.

Vale a pena assistir a 2ª temporada de Sandman?

Daniel Sandman
Daniel Hall. Imagem: Reprodução

Sim, vale. A 2ª temporada traz visuais magníficos, performances emocionais fortes e algumas soluções criativas que mantêm vivo o universo de Sandman. Isso tudo traz para a série um desfecho digno. A imersão nos sonhos e na mitologia dos Perpétuos ainda é fascinante e revelam um mundo rico em simbolismo e ambição poética. Entretanto, o sentimento é que a série teve um desfecho bastante prematuro.

Com a questão de seu cancelamento, a série não alcança o mesmo impacto da primeira temporada. A fragmentação narrativa, a melancolia constante e a diluição de personagens coadjuvantes podem afastar espectadores menos acostumados com dramas introspectivos. Ainda assim, é uma conclusão visualmente poderosa e emocionalmente ressonante.

É uma pena que a séria foi cancelada pela Netflix. Sandman tinha todo o potencial para ser uma série longa, com 10 temporadas. Algo bem maior, tratando toda a mitologia da franquia.

Por fim, Sandman está disponível na Netflix.