“O passado nunca morre. Ele nem sequer é passado” – William Faulkner – frase citada em “Ela Toma Placebo”

Não é apenas nas grandes produções que o cinema brasileiro demonstra sua força. A cena de curta-metragens do país segue revelando talentos, apostando em narrativas ousadas e apresentando resultados que frequentemente surpreendem o público. Entre esses trabalhos que chamam atenção está “Ela Toma Placebo”, um curta que se destaca pela sensibilidade, pelo impacto emocional e pela construção precisa de sua proposta. A produção comprova que, mesmo em formatos mais enxutos, o audiovisual nacional continua entregando obras potentes, capazes de dialogar com temas profundos e de marcar o espectador com uma experiência concisa, mas memorável.

“Ela Toma Placebo” é um filme de terror nacional que mistura drama e horror psicológico em uma experiência intensa e perturbadora. A obra mergulha fundo nos dilemas da saúde mental e nos limites entre realidade e imaginação, prometendo deixar o público em constante tensão.

O projeto nasceu da mente criativa de Lucas Maia, criador do canal Refúgio Cult e especialista em cinema de terror, que assina o roteiro. Na direçãoGabriel Vinícius dá forma a essa ideia ao lado da produção de Lucas Maia e Guilherme Carrara. O elenco conta com Daniel Tonsig, Anna Zanetti e Giovana Telles, que dão vida aos personagens centrais dessa história marcada por intensidade emocional e profundidade psicológica.

Um curta simples, porém grandioso

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Imagem: Divulgação Media Filmes

“Ela Toma Placebo” é daqueles curtas que chegam quietinhos, com aquela energia de que “não vai doer” e depois enfia a faca emocional até o cabo. É um estudo sobre a depressão, sobre a dor silenciosa, sobre a perda e a necessidade desesperada de acreditar em qualquer coisa que mantenha a gente de pé.

A trama acompanha a delicada relação entre uma mãe e seu filho, que lentamente começa a se desfazer conforme ambos enfrentam demônios internos e alucinações crescentes. À medida que o medo se infiltra no cotidiano, a fronteira entre o real e o imaginário se torna cada vez mais tênue, criando uma narrativa que prende o espectador e o deixa à beira da cadeira, sempre esperando algo ainda mais impactante.

A direção aposta em um realismo incômodo: câmera perto demais, silêncio que pesa, cortes secos, e uma atmosfera que parece respirar no mesmo ritmo que o protagonista. Um ritmo irregular, falho, humano. Nada aqui é gratuito. Cada detalhe, da luz fria ao enquadramento claustrofóbico, das comidas estragadas aos diálogos pesados. Tudo isso sugere um mundo apertado demais para quem tenta sobreviver à própria mente. Ao peso da responsabilidade de cuidar de si e também da sua mãe.

Um curta de muita qualidade que merece ser ampliado

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Imagem: Divulgação Media Filmes

Daniel Tonsig segura o filme nas costas com uma entrega brilhante. O olhar dele diz mais do que qualquer diálogo. Ele vive no limite entre a autopreservação e a autoilusão. A grande sacada do curta é justamente essa, não tratar o placebo como piada, truque ou metáfora óbvia, mas como um mecanismo de sobrevivência emocional. Algo pequeno, frágil, mas capaz de sustentar um universo inteiro por alguns segundos. Anna Zanetti também entrega muito no curta. Ela entrega uma mãe frágil, doente, cansada. É impossível não se emocionar com sua personagem, ainda mais se você já conviveu com alguém na mesma situação.

O roteiro é curto, mas certeiro. Não explica tudo e não subestima o público. Ele sugere, deixa pistas, cria interpretações. Parte do terror, mesmo que não seja sobrenatural, vem da ideia de que, às vezes, o que nos consola também nos destrói. As pistas são entregues durante o curta. Uma ligação, um comentário, uma notícia de jornal. Tudo isso cria uma tensão que só é explicada de fato no final do curta. E falando em final, que final! Surpreendente, chocante e talvez de fato necessário.

É lógico que nem tudo é perfeito, algumas cenas são rápidas demais para se pegar alguma informação. De toda forma, quero muito que toda a equipe envolvida tenha a possibilidade de expandir esse projeto, porque eles realmente merecem!

Vale a pena assistir ao curta “Ela Toma Placebo”?

Como dito, o cinema brasileiro está em uma fase muito boa, com muitas produções de arrepiar. Algumas conseguem patrocínios maiores e chegam para mais pessoas, e outras lutam para ter um espaço dentro do mundo audiovisual. “Ela Toma Placebo” é uma produção de ótima qualidade e que merece a atenção de todos.

Além de bem produzido, o curta traz reflexões muito importantes para a sociedade, passando pela questão da saúde mental e indo até pontos mais íntimos como a luta contra o luto. Além disso, é um alerta sobre as consequências que as doenças mentais podem causar se não forem tratadas de fato.

“Ela Toma Placebo” terá sua estreia oficial no dia 12 de dezembro, no REAG Belas Artes, São Paulo.

Crédito da capa: Divulgação Media Filmes