Greice é o novo filme luso-brasileiro que mistura comédia e romance a uma história diferente e ousada, mas divertida. Entre as diversas camadas do filme, o público se envolve cada vez mais com uma protagonista divertida, carismática e com falhas reais. É neste encontro, junto as outras características, que fica claro o quão natural e humana é a personagem vivida por Amandyra. Entretanto, o desenvolvimento profundo e realista da personagem pode ter tido um alto custo na trama em si.
Com a direção de Leonardo Mouramateus, e em 110min, a trama gira em torno da estudante brasileira Greice (Amandyra), que mora em Lisboa, onde frequenta o curso de Escultura, na Faculdade de Belas Artes. – o meio artístico da obra é importante, mas falaremos dele mais a frente. Enquanto tenta renovar seu visto e se manter no estrangeiro, a estudante conhece Affonso (Mauro Soares), um misterioso e rico rapaz, com quem ela começa a se envolver. No entanto, após um incidente durante uma festa, o casal acaba se tornando no principal suspeito de um crime. Assim, ficando a dúvida: quem é o verdadeiro culpado deste crime?
Ao longo do filme, Greice é dita como “amiga das circunstâncias” e encrenqueira. Sendo assim, será que vale a pena acompanhar a história de Greice? Afinal, será que o filme é bom?
Exagero no sal: Afinal, há limites para a ousadia?
Em Greice, a história tem um ritmo próprio, seguindo por uma construção complexa, mas bem desenvolvida. Aliás, a jornada de Greice consegue construir uma personagem completa e humana, com sentimentos e falhas, ao mesmo tempo, em que consegue apresentar o brilho que reflete de sua própria personalidade e ideias.
Soa quase como se já conhecêssemos a personagem de algum outro lugar, de tão real e próxima que ela é introduzida e desenvolvida ao público. Vale ressaltar que o acerto da personagem e seu carisma se deve a atuação certeira de Amandyra, quem dá um “gingado” a uma personagem com tantas camadas.
Entretanto, se o desenvolvimento da protagonista é interessante e com maior profundidade, a narrativa caminha para uma direção contrária. Ou seja, a história como um todo é ousada, mas superficial e leva um tempo para, de fato, conquistar o telespectador.
Dessa forma, o que de fato alimenta a empolgação do filme é a maneira como uma personagem super bem desenvolvida caminha em um enredo raso, que aposta na ousadia, mas peca com cenas e diálogos que extrapolam a ousadia.
A ambivalência do roteiro
Em Greice, o roteiro chega a ser ambivalente: ele trabalha com profundidade em personagens, mas com todo um contexto simples e que não combina com a grandiosidade destes. Além disso, os diálogos conseguem tanto apresentar uma cultura e enriquecê-la tão bem, bem como conseguem ir para a direção oposta e serem supérfluos ou soltos em diversas vezes. Parece até que o foco em muitas falas está mais em querer chocar o público, do que de fato contar uma história ou se aprofundar naquele contexto.
Portanto, a ousadia não deveria ter limites, mas é importante se ter uma noção de como apresentá-la e usá-la. Como já dito, o filme Greice acerta na construção de personagens profundos e ousados. Mais uma vez, o ousar também é um elemento favorável para criar um contexto, uma ambientação, na qual tais personagens se encontram.
Contudo, exagerar no sal, pode matar o sabor do prato. Com o filme não é lá tão bem diferente: o uso desenfreado de uma ousadia, sem uma base para ela, pode prejudicar a experiência do longa.
Greice é um filme que conversa sutilmente com a Arte
Sem dúvida, Greice é um filme divertido e ousado, como já foi dito. Quando estes dois elementos se conversam, há um excelente resultado, principalmente no quesito de montagem de cenas.
Como já foi brevemente mencionado lá em cima, o longa trabalha de maneira curiosa com diversos aspectos do meio artístico, seja através dos elementos que montam a cena, ou então pela própria cena em si. Diversas cenas, principalmente naquelas em que Isabél Zuaa ganha os holofotes, o longa consegue assumir traços de uma obra conceitual. Isso é, ao dar vida a uma personagem do meio artístico, tanto a atuação de Zuaa, quanto a visão da direção, se conversam e criam cenas ora densas, ora repletas de emoção, mas todas com um conceito profundo por trás da tela.
Em outras palavras, Greice se engrandece com a montagem das cenas, ao mesmo tempo, a fotografia fortalece ainda mais o conceito de arte por si só. Isso é, as camadas que montam as cenas possuem uma harmonização com a palheta de cores ou os elementos que compõem de fato aquele momento.
Enfim, Greice pode ter alguns problemas com seu desenrolar da história, porém, o longa consegue acertar tanto com sua fotografia, quanto com os elementos que compõem ou transecionam as cenas.
Afinal, vale a pena assistir ao filme Greice?
Dentre acertos e falhas, Greice é um filme com personagens profundos e uma história rasa. Com um início lento e um pouco cansativo, ou arrastado, o roteiro enfim conquista a atenção do telespectador só depois da metade do filme. A partir de então, o longa enfim apresenta uma história interessante, com personagens atrativos e carismáticos, mas reais.
Aliás, só pela forma como o longa desenvolve seus personagens, principalmente a protagonista, o filme já ganha pontos. Podemos até dizer que a elaboração destas personas é tão recheada, com personalidades e falhas únicas, que elas deixam de ser fictícias e começam a ser retratos de pessoas reais.
Por outro lado, o longa acerta muito com sua fotografia e na maneira como traz elementos artísticos para a tela. Assim, o diálogo entre todos enriquece ainda mais a experiência, seja pela cena, ou pelo conceito implícito das cenas.
Entretanto, nem tudo são flores e nem tudo é acerto. Além da superficialidade do enredo, a trama exagera e passa do ponto quando tenta ousar. Ousadias e inovações são sempre bem-vindas na sétima arte, mas é necessário que as mesmas conversem com a obra em sua totalidade. Assim, aqui, a impressão que fica é tentar chocar o telespectador, ao mesmo tempo, em que apresenta uma nova visão ou cultura para seu público.
Contudo, o uso desenfreado cria diálogos que mais mancham os acertos, quebram a experiência ou só servem para chocar mesmo. E, diga-se de passagem: é o chocar que não leva a nada, nem ao riso, nem a reflexão. Foi uma aposta arriscada, que poderia ser muita boa, se não fosse exageros forçados, ou que causam desinteresse.
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Por fim, Greice é uma obra que tem acertos e falhas, podendo valer a pena para quem quer conhecer o mundo de uma personagem viva e realista. Porém, é importante ter em mente que há cenas que prejudicam o longa como um todo.
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