O filme Malu, dirigido e roteirizado por Pedro Freire, é um mergulho profundo na complexidade das relações familiares, especificamente entre mães e filhas. A trama nos apresenta três gerações de mulheres: Malu, vivida por Yara de Novaes, Lili, interpretada por Juliana Carneiro, e Joana, encarnada por Carol Duarte. Cada uma delas traz para a tela uma carga emocional densa e, ao mesmo tempo, delicada, tecendo uma rede de interdependências e conflitos que permeiam toda a narrativa.

A história de MALU

Malu, a protagonista, é uma atriz que se afastou dos palcos há muito tempo, agora morando em uma vila litorânea no Rio de Janeiro com sua mãe, Lili. A relação entre elas é, ao mesmo tempo, cheia de afeto e dor, como duas metades de um espelho que se refletem de maneira distorcida. Os embates constantes entre as duas são quase sempre seguidos por momentos de cuidado mútuo, criando uma dinâmica agridoce que ressoa de maneira muito real. Quando Joana, filha de Malu, retorna da França para visitar a mãe, encontra uma mulher fragilizada, imersa em um estado psicológico deteriorado.

A abordagem da saúde mental no filme é um dos seus pontos mais marcantes. Malu exibe sinais de um distúrbio psiquiátrico grave, inicialmente sugerido como esquizofrenia, mas que, ao longo da narrativa, revela-se uma condição ainda mais grave. O que me tocou profundamente foi a forma crua como o filme lida com o estigma que envolve diagnósticos psiquiátricos. Existe uma resistência palpável das personagens em aceitar a doença de Malu, o que reflete uma triste realidade ainda presente na sociedade. A dor de Joana e Lili ao tentar entender e lidar com essa situação é quase tangível, gerando uma sensação de impotência que nos consome enquanto espectadores.

“Malu”, primeiro longa-metragem de Pedro Freire
Malu, de Pedro Freire – Foto: Primeiro Plano

Uma direção que nos deixa íntimos do filme

A fotografia de Malu contribui para essa imersão emocional. Freire opta por uma estética intimista, com planos fechados que nos fazem sentir como observadores secretos, espiando momentos de fragilidade e vulnerabilidade. A ausência de requinte visual, quase como se a câmera estivesse crua, sem adornos, nos aproxima ainda mais das personagens, nos forçando a encarar suas dores e medos de forma visceral. Não há distrações, apenas a verdade nua e crua de uma família à beira do colapso emocional.

O filme também aborda temas difíceis como a ditadura, abuso de drogas, homossexualidade, e a sexualidade feminina, todos tratados de maneira respeitosa e ponderada. No entanto, o foco nunca se perde da relação entre Malu, Lili, e Joana. No fim das contas, o filme é um estudo sobre resiliência, sobre a herança emocional que passamos de geração em geração e sobre o perdão – tanto o que damos quanto o que negamos a nós mesmos.

Reflexão profunda

O que mais me marcou em Malu foi o senso de responsabilidade e o peso que a sociedade coloca nos filhos quando se trata dos pais. O filme levanta questões desconfortáveis sobre até que ponto devemos cuidar daqueles que nos criaram, especialmente quando a doença e a velhice transformam esses cuidadores em seres vulneráveis e imprevisíveis.

Por fim, Malu é um filme que nos deixa em silêncio após os créditos. Não é apenas uma obra cinematográfica, mas uma jornada emocional, que nos força a refletir sobre nossas próprias relações familiares e sobre o peso da responsabilidade emocional que carregamos. Um filme que nos toca profundamente, não pelas respostas que oferece, mas pelas perguntas que levanta.