Em Tár acompanhamos um fragmento da história de uma importante Maestrina regente da orquestra de Berlim Lydia Tár, que vive dividida entre as cobranças do trabalho e os tumultos criados pela sua personalidade arrogante, obscura e manipuladora.
Também acompanhamos a conturbada relação dela com a família e os colegas do trabalho, o que não demora a se tornar um transtorno de personalidade perigoso. A atuação de Cate Blanchett no papel da Tár é impecável, e isso justifica sua indicação ao Oscar.
Tár fala sobre poder e seus poderes
A posição de poder ao qual Lydia está envolta é por vários ângulos gerador de todos os problemas. Todd Field dirigiu esse filme focado no poder da fala e da persuasão. Essas duas características quando usadas para um proposito pessoal e autoritário, pode revelar o que há de pior na pessoa. Esse tipo de situação é muito comum é posições de autoridade, e é assim que a personagem de Blanchett age. Principalmente quando trazemos isso para o nosso momento atual da sociedade. É importante frisar que a história do filme se passa pós-pandemia, então, podemos crer que ele quis passar a impressão do caos que os novos hábitos e comportaremos adquiridos são consequências do que vivemos. Ou não.
Verdade é que podemos ver claramente os sinais de algumas “doenças” que a modernidade e a tecnologia nos deram até agora. Fake News, o uso indiscriminado das redes sociais, o vício no dialogo virtual. Ao mesmo tempo podemos ver que algumas pessoas, nuas e cruas, quando vivem ainda no mundo analógico, estão expostas aos resultados cruéis dessa vivência caótica. Isso sem falar.
A relação de poder entre chefe e funcionário, entre professor e aluno, entre casais, entre pai e filho, entre sonhos e realidades. Esse é talvez o grande acerto dessa história complexa, profunda, intensa, caótica, que soa sem sentido em um mundo que de fato não faz sentido. Talvez o caos apresentado por Todd não seja mera coincidência.
Ainda falando do poder que foge ao controle, Lydia também tem uma compulsão sexual por pessoas do trabalho, seja no passado ou no presente. Ou seja, aparentemente faz parte do traço de personalidade dela exercer um poder abusivo sexual com suas funcionárias ou alunas, incluindo abuso sexual. Apesar do diretor preferir deixar as coisas implícitas, é perceptível essas situações escabrosas.
É preciso falar dos problemas!
O roteiro nos dá informações pelas metades como se já a conhecêssemos. Somos apresentados a vários pontos da vida de Lydia como se o carro já estivesse em movimento. A relação dela com a esposa e os problemas do casal já está posto, a dependência dos remédios e a adoção da filha do casal. Como nada disso é introduzido, somos obrigados a preencher os espaços vazios com elementos que são dados ao longo do filme. Os relacionamentos de Lydia também não são aprofundados. A relação com sua esposa se limita aos momentos em que as duas se encontram em casa, e na orquestra, já que ambas fazem parte da mesma formação. Porém, não é possível entender a relação e os problemas das duas. Ou seja, são picos de informação que o roteiro desfaz rapidamente. Quase nada é reaproveitado, quase nada é abordado novamente.
Mas aqui vamos entrar um ponto importante sobre como interpretar essa história, que pode parecer totalmente incompreensível. O diretor trabalha nas sutilezas, onde a ausência das informações completas faz parte da intenção de demonstrar o caos. O caos que a Lydia vive tanto em sua carreira quanto em sua vida, e prova disso é a perturbação sonora que ela tem. Pequenos sons ou sons repetitivos deixam a maestrina em aflição, aliás, não somente ela, mas a nós também.
Resultado final pode não agradar
Assim, o resultado final do filme dirigido por Todd Field se torna cansativo, trazendo uma sensação de falta de sentido e objetividade que com certeza irá desagradar quem não gosta desse estilo de filme. É um longa para quem aprecia dramas que se aprofundam no abismo obscuro das pessoas sem necessitar de grandes explicações. Mas pode ser bem decepcionante para quem gosta de filmes que prezam pelas reviravoltas empolgantes do segundo ato. Isso porque o terceiro ato de fato é interessante e intenso, mostrando que houve sim um potencial desperdiçado em boa parte do filme.