Estamos vivendo tempos tão sombrios que assusta quando a ficção consegue esbarrar na realidade com tamanha precisão. Em seu quinto e último filme, Uma Noite de Crime: A Fronteira consegue nos fazer pensar qual seria o limite para toda a maldade que temos visto na humanidade ultimamente. Sem deixar de lado o cerne da história, o filme da Universal em parceria com a Blum House consegue se refazer e trazer terror, ação e crítica politica no mesmo filme.
Mas e se uma noite não for o suficiente? Nesta sequência da franquia “Uma Noite de Crime”, os sobreviventes são obrigados a aguentar muito mais que 12h de terror, e se encontram no meio de um caos total provocado por saqueadores de uma seita sem lei que querem que o Expurgo seja para sempre.
A noite do expurgo, onde todos podem cometer crimes por doze horas, inclusive assassinato, sem sofrer nenhuma consequência, continua sendo uma politica de segurança pública americana na franquia. Porém, agora parece que somente meio dia de fúria não é suficiente e os grupos rebeldes quebram as regras para fazer do expurgo uma ação eterna. Adela (Ana de la Reguera, Army of the Dead: Invasão em Las Vegas) e seu marido Juan (Tenoch Huerta, série Narcos: México) fogem do méxico onde viviam e decidem se mudar (ilegalmente) para o Texas, onde Juan trabalhará para a rica família Tucker em uma de suas fazendas.
O enredo principal desse filme é a intolerância racial e contra os imigrantes, e esse tema é manifestado de duas formas, pelo extermínio dessas pessoas pelo expurgo e pelo preconceito do filho do Tucker, Dylan (Josh Lucas, Ford vs Ferrari). Apesar de bem satirizada e quase caricata a maneira como esse preconceito é mostrado no filme, a explicação que o roteirista usa para tal ato é bem convincente, e é justamente seu pai quem consegue explicar isso em uma única cena. É preciso dizer que mesmo construindo uma crítica genuína o filme de James DeMonaco não faz muita questão de “dar nomes aos bois” e deixa tudo muito subentendido a quem direciona seus questionamentos, mas pode se explicável se você pensar que um filme de terror não precisa ser um manifesto politico em sua totalidade.
A abordagem do tema é muito forte, é notável que o roteiro se baseou nas mudanças comportamentais do povo americano nos últimos tempos, principalmente na era Trump, com o aumento da raiva e do preconceito dos americanos mais conservadores contra outros povos, outras raças e até mesmo outros espectros políticos. A aparente raiva crescente, que pode ser comprovada pelos ataques virtuais e até mesmo violentos de uma parcela da população americana contra Negros, imigrantes, homossexuais, é claramente base para um roteiro que apesar de ser ficcional esbarra facilmente na realidade. O questionamento sobre o controle de armas também pode ser alcançado ao ver que em toda a extensão do filme as armas são coadjuvantes nas cenas, o diretor Everardo Valerio explora muito bem as tomadas de destaque e close nas armas colocando em primeiro plano.
O cineasta e roteirista James DeMonaco, que assina o roteiro do filme, consegue abordar o tema da imigração de forma bem profunda, principalmente se levar em conta o momento em que os EUA estavam passando durante a construção do texto, e ele consegue mostrar o pior do ser humano, o ódio, a raiva, o rancor, e deixa a compaixão e o amor como pano de fundo para as reflexões.
Apesar de ser um filme extremamente violento, com cenas perturbadoras em alguns momentos e que podem deixar algumas pessoas enojadas, a ação embebida no terror é suficiente pra manter o espectador ligado e apreensivo durante os quase 90 minutos de filme. É preciso lembrar que sendo o último filme da franquia o final pode não fazer tanto sentido por não explicar o resultado de tantos anos de expurgo, mas serve ao seu proposito de ser sombrio e reflexivo na maior parte do tempo.