No Dia Mundial da Poesia, celebrado em 21 de março, mergulhamos no universo da música para explorar como as poesias influenciam e inspiram composições inesquecíveis. Das baladas melancólicas aos ritmos vibrantes, a junção entre poesia e música revela-se como uma fonte infinita de arte.
Por isso, elaboramos essa lista com músicas que inspiradas em versos poéticos, com artistas nacionais e internacionais. Confira:
Fagner e Cecília Meireles
Cecília Meireles é uma das maiores poetisas do Brasil. Os seus poemas são marcados por uma sensibilidade única e uma profunda conexão com temas universais, como amor, morte, natureza, tempo e a efemeridade da vida. Sua escrita delicada e introspectiva reflete uma busca constante pela essência humana e espiritualidade, permeada por imagens poéticas e simbolismo.
Não a toa, o cantor Fagner, conhecido por suas letras poéticas, escolheu o poema ‘Motivo’. Esse poema fala sobre a efemeridade da vida e da passagem do tempo. Além disso, a autora aborda a ideia de que tudo na vida é transitório e passageiro, e que as experiências vividas são apenas momentos que logo se dissipam.
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
– não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.Sei que canto. E a canção é tudo.
Cecília Meireles, Viagem (1939)
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
– mais nada.
Ney Matogrosso e Fernando Pessoa
Fernando Pessoa é um dos maiores poetas portugueses e teve grande influência no Brasil. Na poesia, o autor reflete sobre a identidade, a existência humana e o mundo ao seu redor. Já Ney Matogrosso caracteriza sua música por uma voz marcante e uma abordagem ousada e inovadora. Como um dos mais icônicos cantores brasileiros, Ney é conhecido por sua versatilidade e capacidade de transitar por diversos gêneros musicais, incluindo MPB, rock, pop e música regional.
A junção desses dois é a música ‘Não, Não Digas Nada’, com o mesmo nome do poema.
Não: não digas nada!
Supor o que dirá
A tua boca velada
É ouvi-lo já.
É ouvi-lo melhor
Do que o dirias.
O que és não vem à flor
Das frases e dos dias.
És melhor do que tu.
Não digas nada; sê!
Graça do corpo nu
Que invisível se vê.
Fernando Pessoa
Além disso, Ney Matogrosso, junto do grupo Secos e Molhados, também adaptou o poema A Rosa de Hiroshima, de Vinícius de Moraes.
Legião Urbana e Luiz de Camões
A poesia de Luís de Camões, um dos maiores poetas da língua portuguesa, é marcada pela profundidade emocional, beleza lírica e riqueza de temas. A influência do poeta se estende por séculos, e sua poesia continua a inspirar leitores, escritores e músicos, como é o caso de Renato Russo, da Legião Urbana.
A música ‘Monte Castelo’ possui diversas referências, inclusive um trecho do Soneto 11, de Camões. A canção aborda a ideia de que, apesar das dificuldades da vida, é possível encontrar força e significado por meio da fé e do amor.
Amor é um fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.Mas como causar pode seu favor
Luiz de Camões
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?
João Cabral de Melo Neto e Chico Buarque
O poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto escreveu Morte e Vida Severina, que foi musicalizado por Chico Buarque. ‘Funeral de um Lavrador’, uma das músicas emblemáticas de Buarque, retrata a dura realidade dos trabalhadores rurais e suas lutas por melhores condições de vida.
Com uma melodia comovente e letras profundas, a música denuncia as injustiças sociais e a opressão enfrentada pelos lavradores. Chico Buarque, um dos maiores nomes da música brasileira, mescla sua poesia lírica com críticas sociais, trazendo à tona questões importantes sobre desigualdade e exploração. Uma canção que ressoa até os dias atuais, tocando os corações e as consciências de quem a ouve.
Adriana Calcanhotto e Waly Salomão
A música de Adriana Calcanhotto é conhecida por sua poesia delicada e melodias envolventes. Ela explora uma ampla gama de estilos musicais, incluindo MPB, bossa nova e pop. Suas letras frequentemente abordam temas como amor, saudade, feminilidade e questões sociais, enquanto sua voz suave e expressiva cativa os ouvintes.
Dessa forma, não é difícil imaginar a artista trabalhando com a poesia de Waly Salomão. O poeta brasileiro é reconhecido por sua contribuição singular à literatura nacional. Com uma escrita experimental e marcante, Salomão explorou temas como arte, política e cultura pop. Além disso, sua poesia multifacetada e repleta de imagens vívidas cativou leitores e críticos ao longo dos anos.
A poesia Madeiras do Oriente se transformou na música ‘Teu Nome Mais Secreto’.
Só eu sei teu nome mais secreto
Só eu penetro em tua noite escura
Cavo e extraio estrelas nuas
Cardumes de cometas e conchas
De tuas constelações cruas.
Abre-te sésamo! – brado ladrão de Bagdá
Só meu sangue sabe tua seiva e senha
E de gala irriga as margens cegas
Areias de tuas elétricas ribeiras,
Sendas de escarpas, grutas ignotas,
Porto de tainheiros.
Waly Salomão
Leminski e Caetano Veloso
Caetano Veloso, que fará uma turnê em breve com sua irmã Maria Bethânia, sempre escreveu verdadeiras poesias em formato de música.
A poesia de Leminski, renomado poeta brasileiro, é marcada por sua originalidade e profundidade. Suas obras exploram temas como amor, liberdade e introspecção, cativando leitores com sua linguagem poética única.
‘Verdura’, música de Caetano Veloso, dialoga com essa temática ao trazer reflexões sobre a natureza humana e a passagem do tempo. A conexão entre a poesia de Leminski e a letra da música de Veloso revela a influência mútua entre poesia e música na cultura brasileira, enriquecendo o panorama artístico do país.
de repente
me lembro do verde
da cor verde
a mais verde que existe
a cor mais alegre
a cor mais triste
o verde que vestes
o verde que vestiste
o dia em que te vi
o dia em que me viste
de repente
vendi meus filhos
a uma família americana
eles têm carro
eles têm grana
eles têm casa
a grama é bacana
só assim eles podem voltar
e pegar um sol em copacabana
Paulo Leminski
David Bowie e Hugh Mearns
A música de David Bowie, ‘The Man Who Sold The World’, é reverenciada por sua originalidade e profundidade artística. Inspirada pela obra do poeta escocês Hugh Mearns, Bowie explorou temas de identidade, realidade e ilusão em suas composições.
‘The Man Who Sold The World’ destaca-se pela sua atmosfera sombria e letras enigmáticas, refletindo a habilidade de Bowie em criar narrativas intrigantes. A influência de Mearns na poesia de Bowie acrescenta camadas de significado à sua música, enriquecendo a experiência auditiva dos ouvintes e solidificando o legado artístico de ambos os artistas.
Pink Floyd e Angus Charles Graham
Pink Floyd, lendária banda de rock progressivo, é reconhecida por sua inovação e profundidade musical. Uma de suas músicas icônicas, ‘Set The Controls For The Heart Of The Sun‘, transporta os ouvintes em uma jornada psicodélica e introspectiva. Inspirada pelo livro de poesia Poems Of The Late T’ang, traduzido por A.C. Graham, a música de Pink Floyd dialoga com temas de transcendência e mistério. A interação entre a música da banda e a poesia chinesa do livro cria uma experiência sensorial única, mergulhando o público em um universo de imaginação e reflexão.
Cássia Eller e Clarice Lispector
Cássia Eller, renomada cantora brasileira, deixou um legado marcante na música popular nacional. Conhecida por sua voz poderosa e interpretações emocionantes, Eller cativou o público com sua autenticidade e intensidade. ‘Que O Deus Venha‘, uma das músicas emblemáticas de sua carreira, reflete essa profundidade artística.
Inspirada pelo poema Que O Deus Venha, de Clarice Lispector, a música de Eller dialoga com temas de espiritualidade e existencialismo. A conexão entre a interpretação de Eller e a poesia de Lispector cria uma experiência emocional única para os ouvintes. Essa interação entre música e poesia enriquece o panorama cultural brasileiro, destacando a influência duradoura de ambas as artistas na arte brasileira.
A música também recebeu interpretações Adriana Calcanhotto, Frejat e Cazuza.
Menção honrosa – a poesia e as músicas de Bob Dylan
Bob Dylan, lendário músico e poeta norte-americano e ganhador do Nobel de Literatura, é reverenciado por sua contribuição inestimável à poesia em suas músicas. Ao longo de sua carreira, Dylan cativou o público com sua habilidade singular de mesclar poesia e música de forma envolvente e impactante. Suas letras profundas e introspectivas exploram uma variedade de temas, desde questões sociais e políticas até reflexões sobre a condição humana.
Além disso, com sua voz distintiva e estilo autêntico, Dylan conquistou admiradores em todo o mundo. Sua poesia, refletida em suas letras poderosas, transcende gerações e continua a inspirar artistas e ouvintes até os dias de hoje. A contribuição de Dylan para a música e a poesia é incomparável, solidificando seu lugar como uma das figuras mais influentes da cultura contemporânea.