Caio Cortonesi é autor do livro “A Não-Ilha”, uma ficção contada em realidades paralelas, envolvendo cinco personagens protagonistas, tendo como base uma forte crítica ao cenário do Brasil. Cortonesi é brasileiro, mas optou por morar na Inglaterra. Em entrevista ao GeekPop News, o autor fala sobre as fontes de inspiração e os toques críticos que a própria obra e vivência podem trazer de reflexão ao leitor.

Primeiramente, fale um pouco sobre você e o que lhe trouxe até aqui.

Sou brasileiro, mas atualmente vivo e trabalho na Inglaterra. Depois de uma longa carreira como cineasta e produtor musical vi que o Brasil estava se tornando um país cada vez mais hostil contra seus artistas e livres-pensadores e, numa reação instintiva, deixei o país. Mais tarde descobri que escrever um livro em português sobre o Brasil seria uma parte essencial do processo de sarar, e de entender o que me fez ir embora.

Reprodução: Livro "A Não-Ilha" de Caio Cortonesi
Reprodução: Livro “A Não-Ilha” de Caio Cortonesi

Como a escrita surgiu em sua vida?

Escrever sempre foi uma paixão, o que é natural quando se é obcecado por livros. A escrita também sempre foi importante para meu trabalho no cinema, afinal, antes de todo filme, vem o roteiro. Mas no cinema a arte em si acontece no set – o roteiro tem um caráter técnico, explicativo. Já um livro tem vida própria, e queria tentar soprar essa vida no papel. Espero ter conseguido.

Sobre “A Não-Ilha”, o que as pessoas poderão encontrar durante a leitura?

Histórias de uma terra sem nome, mas que todos que nascemos nela sabemos bem qual é. São contos que terão significados diferentes para diferentes pessoas, tocando em feridas que nem sempre nos damos conta que estão lá. Além, claro, de um bocado da História oculta, aquela que não aprendemos na escola.

O que te inspirou a desenvolver essa narrativa, que mistura fantasia com ficção histórica?

Foi a percepção do abismo que existe entre o que é e o que poderia ter sido. De infinitas possibilidades. O mundo no qual vivemos resultou de uma trajetória histórica específica. Pensando no quanto o mundo poderia ser diferente caso os nativos americanos tivessem cruzado o Atlântico antes dos europeus, pensei: “Já que é ficção, por que me deter no mundo real?”. Daí surgiu a ponte com a literatura fantástica, que tentei criar usando a visão de mundo dos povos ameríndios. Algo como, “Se Tolkien fosse Tupi, que passado mitológico ele criaria?”

Reprodução: Arquivo pessoal
Reprodução: Arquivo pessoal

De que forma você quis que a mensagem de crítica social chegasse até o leitor?

Metade do livro se passa no mundo real, contando histórias de ficção que poderiam ser reais – e talvez até sejam. Sou apaixonado por História, e creio que aprender sobre o passado é o único modo de entender o presente. O livro desbrava uma pequeníssima parte de um passado esquecido que, espero, ajuda a esclarecer sobre como o Brasil se tornou uma terra de tanta beleza, mas também de tanto autoritarismo e violência.

Quais os seus planos futuros dentro da carreira como escritor?

Além de lançar “A Não-Ilha” em outros idiomas, também finalizei um romance em inglês que planejo publicar em breve. Caso tudo corra bem, tenho mais alguns livros dentro de mim que estão batendo na porta, pedindo para sair. Creio que é material o suficiente para me manter ocupado por muitos anos.

O que você diria para quem quer começar a escrever, mas ainda não se sentiu motivado para começar?

Como todas as formas de arte, a escrita exige uma quantidade enorme de vontade e, por que não, cara-de-pau? Eu diria que, para desenvolver a vontade, é essencial ter paixão por livros: Correr atrás de uma paixão é bem mais fácil do que de algo do qual não se gosta. É muito mais fácil aprender a cozinhar preparando o que se gosta de comer. Assim, antes de escrever, é fundamental ler, e muito. Já a cara-de-pau é importante pois você estará criando literatura num mundo no qual a esmagadora maioria das pessoas não se interessa por livros. Você vai ouvir muitos comentários pessimistas, desmotivadores. Só com uma dose cavalar de teimosia se consegue seguir em frente.

Reprodução: Capa do livro "A Não-Ilha", de Caio Cortonesi
Reprodução: Capa do livro “A Não-Ilha”, de Caio Cortonesi

E para saber mais sobre o seu trabalho, quais as plataformas e meios de te encontrar?

Além do meu website (caiocortonesi.com), estou no Instagram (instagram.com/caiocortonesi), Twitter (twitter.com/caiocortonesi) e Facebook (facebook.com/cortonesi). Costumo brincar que, com meu nome engraçado, sou uma das pessoas mais fáceis de encontrar no mundo. Só jogar no Google que não tem erro.

Tem mais alguma coisa que você gostaria de acrescentar?

É o primeiro turno das eleições no Brasil, e amanhã vou dar a minha pequenina contribuição para livrar o país de uma de suas piores doenças. Hoje li uma passagem de Vasily Grossman, jornalista ucraniano que cobriu a segunda guerra, que gostaria de compartilhar em tradução livre:  
“A História é a batalha de um grande mal que tenta esmagar a pequena semente da bondade humana. Mas se o que há de humano nos seres humanos não foi destruído até hoje, significa que o mal jamais irá prevalecer.”