Claudia Priscilla é uma cineasta e roteirista brasileira. A diretora é graduada em Jornalismo e estreou no cinema dirigindo o curta-metragem Sexo e claustro. Além disso, ganhou o prêmio de melhor filme e melhor direção no Festival de Paulínia com seu filme Leite e ferro, também vencedor do prêmio de melhor longa no Femina.
Recentemente, seu documentário “Eu Deveria Estar Feliz” estreou no canal GNT, que traz a jornada de quatro mães completamente diferentes que viveram a depressão pós-parto, conseguindo superá-la através do afeto. A depressão pós-parto é um distúrbio de saúde mental que afeta algumas mulheres após o parto.
Agora, confira a entrevista com a cineasta
Hoje a gente vai entrevistar a cineasta e diretora de cinema, Claudia Priscila, e conversar um pouco sobre o seu novo documentário, “Eu Deveria Estar Feliz”. Primeiramente, Claudia, fala um pouco sobre você pra gente.
Eu sou cineasta, trabalho mais com documentário, prioritariamente com documentário, e meu grande tema é gênero, assim. Há muito tempo eu faço trabalhos com esse tema, que é gigante, é um tema muito extenso, então, de tempos em tempos, eu tenho a felicidade de colocar uma lente em cima de um pedaço desse tema.
No documentário “Eu deveria estar feliz”, qual foi a sua inspiração por trás da história e como você desenvolveu essa ideia?
Eu recebi um convite do Rick Vidal, que é o produtor do filme. Ele tem uma história pessoal, que a mãe dele passou por depressão pós-parto. Quando a gente fez a primeira reunião, super rolou, a gente falou, deu um match, e a gente fez o filme, e, enfim, estamos com um monte de projetos. Então, o filme sempre nasce de algum lugar, nasceu na cabeça do Rick, e depois a gente foi forjando esse filme, foi entendendo esse filme ao longo do tempo. Daí, logo na sequência, começou a pesquisa, depois a produção, e entrando mais pessoas, a gente fez um time majoritariamente feminino. Então, nasce da ideia do Rick e depois ele vai se construindo. A gente começa a pensar como vai ser essa narrativa fílmica, quem são essas mulheres que vão estar lá. Então, acho que o filme tem vários começos, sabe? Começo de cada etapa.
Quais foram os desafios encontrados durante a produção do documentário?
Acho que o maior desafio de um documentário são as personagens, né? A relação que se cria, que eu acho que é necessário, no meu caso, eu gosto muito de ter uma relação de confiança e intimidade com as personagens. Então, a gente fez dois meses de pesquisa e chegamos nessas quatro pessoas. E os personagens do filme, que têm como a depressão e o pós-parto, mas também elas são histórias singulares, são histórias únicas, cada uma vivencia de uma forma diferente, tanto os sintomas, enfim, Eu gosto muito desse ponto em que elas se afastam. A gente está falando de universos diferentes, um tema, mas que abarca experiências distintas. Então, acho que acessar essas mulheres… Eu lembro quando estava conversando com a Lorena, que é uma das personagens do filme, e aí, nesse dia, eu falei “Nossa, eu estou acessando o pior que você tem, a sua pior memória”. E eu acho que, para elas, eu acessei lugar de muita dor. Então, eu acho que esse foi um grande desafio, como fazer isso. Então, a primeira coisa foi, a gente estabeleceu conversas antes de ligar a câmera. Ainda era época de pandemia, a gente tinha uma distância grande geográfica, fiz algumas conversas com elas online e juntas a gente foi entendendo como a gente ia contar aquela história. Então, quem seriam as pessoas que conversariam com elas ao longo do filme, como é o cotidiano delas e o que valeria a pena a gente estar junto e registrar. Então, acho que essa foi a maior dificuldade, o meu maior desafio era entrar na vida dessas mulheres. Mas também, ao mesmo tempo que eu sabia que eu estava exigindo, que eu estava pedindo uma memória de dor, eu também encontrei essas mulheres num lugar mais potente, já de cura ou por aça, Então, também era bonito ver como elas conseguiram formar um elo afetivo, uma ética amorosa com os filhos. Então, tinha esses dois lugares de acesso durante o filme.
Eu acho que a próxima pergunta complementa muito no que você está falando agora, que foi como foi para você ouvir essas quatro histórias e poder dirigir e agora passá-las para o resto do mundo?
O meu processo de filmar é sempre um misto de prazer e dor, é sempre isso. Eu me envolvo muito com o tema, geralmente estou completamente em função do projeto. Então, ele começa antes na pesquisa de personagens e também pesquisa bibliográfica, pesquisa de filmes, então tem todo o envolvimento. E eu não tive depressão pós-parto, mas eu sou mãe, então eu me via muito ali, eu me via muito naquelas mulheres. Tem espaços ali que eu falo “Hum, passei por isso”. Então acho que é muito bom fazer um filme, é muito gratificante, mas, ao mesmo tempo, eu sempre me jogo demais na história, sabe? Eu me jogo demais nos meus projetos. Então, isso é transformador na minha vida. Cada filme eu saio de uma forma transformada, tocada em lugares que eu ainda não conhecia bem em mim.
Como você enxerga o impacto que o documentário “Deveria estar feliz” vai ter na sociedade.
Eu acredito muito no documentário como uma ferramenta de discussão de temas importantes, temas tabus na nossa sociedade, como é o caso Então, acho que é assim, é como se lançasse uma pedrinha, sabe? Na água, que vai gerando ondas. E esse filme tem um lançamento de impacto. Eu acredito muito no documentário como uma ferramenta para discussão de temas importantes, temas tabus da nossa sociedade. É como se jogasse uma pedrinha na água e ela fosse criando, sabe, aquelas ondinhas. E junto ao filme, a gente está fazendo um lançamento de impacto. Então, existe um aplicativo que foi desenvolvido pela equipe da Unifesp, com informações, com lugares de ajuda para mulheres que estão em condições de depressão pós-parto. Também tem lugar para as pessoas mandarem seus relatos, enfim, é um espaço ali de cuidado e ajuda. Então, a gente está trabalhando com essa ferramenta que atende esse lugar de emergência que tem o tema. E tem uma… A gente também está esperando um projeto de lei para ser homologada do Dia Nacional de Combate à Depressão Pós-Pátria, que está em curso em Brasília. E fora isso, também a gente está fazendo exibições com debates, do filme para ONGs e entidades que tenham ligações com o tema. Então, assim, é um lançamento que atende para além do cinema e da TV.
O tema depressão pós-parto é um tema muito delicado e muitas vezes as pessoas não acreditam que a mãe possa estar com depressão pós-parto. No documentário fica muito claro a história real dessas mães. Vocês acham que vão receber algumas críticas negativas sobre isso? Sobre tocar nesse assunto?
Eu não sei, por que eu vejo como um assunto extremamente importante e o que eu tive de devolutiva até agora foi pessoal. Mas sempre tem né? Sempre tem quem não goste. É um tema importante que a gente sabe que uma em cada quatro mães tem depressão pós parto. E isso é o número que chega em consultório, hospitais e eu imagino que esse número seja muito maior. A sociedade não sabe, então muitas vezes o entorno dessa pessoa, a rede de apoio ou enfim as pessoas da casa, não sabem que estão passando por uma depressão pós parto. Então eu acho que a informação e a discussão desse momento, como no filme que trata de pessoas que passaram pela experiência gestacional, é um corpo em processo. E eu acho que a maternidade, o parto, ele é uma experiência tão radical que eu acho que ninguém sai ilesa desse lugar, sabe? E algumas pessoas vão demorar um tempo para entenderem, se encontrarem e se assumirem nesse papel social de mãe. E outras pessoas podem nunca se encontrar, a gente tá falando de um território de mudança radical. E eu acho que aí as pessoas não falarem da depressão pós parto tem uma relação muito grande com uma questão moral. Então assim, uma boa mãe ama seu filho, cuida do seu filho, teoricamente na romantização falam que a gente já vai saber cuidar, então tem essa fantasia em torno da maternidade. E uma mãe que ela não está correspondendo esse lugar, automaticamente ela é uma má mãe. Então acho que tem essa confusão moral e ética da maternidade, então acho que a gente precisa tirar esse véu por que se não a gente fica numa marca dicotônica ali, eu vou ser uma mãe que cumpre ou eu vou ser uma péssima mãe, a gente não consegue olha pra esse assunto com nuances, com delicadeza, com variedades. Cada corpo, cada mãe, vai responder de um jeito. Então assim, a gente não pode simplificar essa experiência de uma forma tão simplista.
Por fim, qual dos seus documentários ou filmes você indica para os nossos espectadores e nossos leitores?
Bom, tem o “Bicha Travesty” que é o último filme que fiz antes do “Eu Deveria Estar Feliz”, que é sobre a artista Linn da Quebrada, que enfim eu dirigi com o Kiko Goifman e a Linn assina o roteiro com a gente e foi um processo incrível fazer esse filme. Foram muitas descobertas, muitas alegrias e foi bastante importante na minha vida. E esse está disponível no Canal Brasil.
Confira a entrevista completa com Claudia Priscilla no nosso canal: