Caetano Cury tem 36 anos, é jornalista, ilustrador e autor dos livros em quadrinhos “Téo & O Mini Mundo” (que até então, tem dois volumes), Click Plock e “Jorge”, que tem lançamento previsto para o próximo mês. Atualmente, Cury reside em Guaxupé, Sul de Minas. Além disso, o quadrinho Téo & O Mini Mundo foi indicado 5 vezes ao HQ Mix e, em 2020, recebeu o prêmio de melhor Web Quadrinho, pelo troféu Angelo Agostini. Em entrevista ao Portal GeekPop News, Caetano fala um pouco sobre a própria vivência dentro do universo artístico entre aquarelas, conceitos para estruturar uma boa história em quadrinhos e criação.
“Todos eles (quadrinhos) são retratos de vivências, retratos de coisas reais que eu vivo ou que eu sinto ou que ouço, ou que eu vejo, ou que eu leio, ou o que eu imagino e sinto a necessidade. Vejo uma oportunidade de congelar essas histórias, adaptar essas histórias do cotidiano, essas observações, adaptar e transformar elas em outras coisas que são os quadrinhos, que são interpretados de formas distintas pelas pessoas que vão lendo.” (Caetano Cury)
Como surgiu essa paixão pelos desenhos? Em que momento você decidiu transformar os desenhos em histórias? Entre diálogos e reflexões?
A minha mãe é uma artista plástica, então desde criança eu convivo nesse mini mundo de artes plásticas, de pinturas e artesanatos. Eu sempre tive acesso a material de pintura, sempre vi minha mãe pintando. Ela não faz quadrinhos, mas a leitura de Turma da Mônica, Asterix, Tintim, esses quadrinhos de quando eu era criança, eu lia. Tinha os gibis da Disney também, tirinhas de jornal e eu gostava muito. Eu achava que era uma linguagem mais simples, prende a atenção. Dá pra falar muita coisa usando texto e imagem. E com uns 5, 6 anos eu já fazia quadrinho. E não parei. Adorava as aulas de produção de texto que tinha na escola, que você tinha que escrever, fazer redação. E de vez em quando nas aulas de produção de texto tinha produção de histórias em quadrinhos. Nossa, pra mim era o auge da minha vida de estudante.
Dentro de todo seu trabalho, você também ministra um curso online sobre aquarela. O que te motivou a produzir algo assim e quais os retorno você tem disso?
As pessoas que fazem o curso de aquarela são pessoas que conhecem o Téo & O Mini Mundo, outras não, porque eu faço também uma divulgação patrocinada e tem meu instagram pessoal. Eu não falo de tirinhas no curso. Embora eu use tirinhas para dar exemplos da fluidez da aquarela. Mas o objetivo final do curso de aquarela não é fazer quadrinhos, é pintar imagens que a gente vê, é quase uma coisa terapêutica, é arte pela arte. Não é uma arte para passar uma mensagem, tipo “quero dizer tal coisa, então eu vou dizer tal coisa fazendo um tirinha”. A tirinha, ela tem uma mensagem um pouco mais objetiva, apesar de existir a possibilidade de fazer coisas extremamente subjetivas. Eu faço algumas tirinhas que são subjetivas.
Você vê, por exemplo, Laerte faz tirinhas que você tem milhões de interpretações. Quando eu quero passar uma mensagem mais pontual, mais objetiva, eu faço uma tirinha. Agora quando eu quero reproduzir uma imagem, sem querer dizer nada, aí eu faço uma pintura em aquarela. E é isso que eu coloco no curso, eu mostro as técnicas, as bases, o que é o essencial para começar a pintar e as características de aquarela. Ele é um curso de introdução, mas ele é bem completo.
E é uma coisa que dá uma uma alegria muito grande, pintura aquarela, eu diria que pra mim é até um hobby. Embora eu faça tirinhas em aquela, mas fazer aquarela da paisagem, pegar uma casinha pintar, fazer uma árvore, uma estrada de terra, pintar uma vaquinha. Eu gosto. Sem ter que colocar balão, sem ter que colocar contorno, sem ter a obrigação de fazer ser entendido por aquilo.
Porque a tirinha é trabalhosa. Você tem que escolher a palavra certa, tem que escrever o texto com as palavras corretas, com o texto centralizado, do tamanho certo, com as palavras corretas, o balão tem que estar na posição da esquerda para direita, do alto para baixo, de um jeito que as pessoas vão conseguir ler, para não confundir, para não ler o segundo (balão) antes do primeiro. A pintura em aquarela ela tem algumas regras também, mas ela é muito mais livre.
Você deu uma introdução falando que gosta de ver o seu cotidiano, que você se inspira nisso. Mas, especificamente para Téo & O Mini Mundo, quais foram os elementos do seu dia a dia que te levaram a produzir a escrita dessa obra em especial?
Não tem um elemento específico assim. Eu diria que, vamos chegar no presente aqui. Tem um terceiro livro que eu quero lançar esse ano. O terceiro livro tem tirinhas bem românticas, talvez até mais que os outros dois primeiros. Isso coincide com o período em que eu conheci a Val, que é minha namorada e tem muitas tirinhas que são inspiradas na nossa relação. Coisas que a gente conversa, coisas que a gente vive.
Eu não me desenho especificamente, eu não desenho ela especificamente, mas tem muitas situações ali, que você vai ver alguns personagens que por trás daquilo estão histórias que a gente viveu e segue vivendo. Então, eu acho que depende. Toda arte, acho que a literatura, o cinema, teatro, ela tem um elemento real ali, ela tem uma coisa que o seu autor viveu ou está vivendo ou está sentindo. Mesmo que talvez não seja por ele. Eu já fiz tirinha sobre coisas que outras pessoas estão sentindo e que eu aprendi. Então é bom fazer um alerta aqui, porque o livro não é autobiográfico, nenhum dos dois e terceiro, enfim. Talvez o livro do Jorge seja o mais autobiográfico de todos (risos).
Quando começou, você imaginava esse retorno positivo em relação a sua obra? Como foi esse processo?
A gente tem uma vontade de fazer com que as pessoas conheçam o trabalho, porque ninguém faz nada para ficar guardado, a gente quer que as pessoas conheçam. Eu tinha um blog que chamava “Clube do Pança”, que eram as tirinhas que eu fazia antes do Téo & O Mini Mundo, 15 anos atrás.
No auge da época dos blogs eu tinha 300 visitas por dia. Pensava: “nossa, tem 300 pessoas entrando todo dia no meu blog”. Sabe, era muita gente. ”É um negócio incrível, como que eu consegui chegar nesse ponto? não esperava”. Hoje eu faço um post, tem 30 mil curtidas. E se for ver quem visualizou, são 200 mil, 300 mil que visualizaram um único post. Hoje, tem 260 mil pessoas seguindo no instagram do Téo & O Mini Mundo. Então, nunca que você vai imaginar que vai conseguir falar para um público que é 4 vezes ou mais o tamanho da minha cidade, vamos dizer assim. É nichado, são pessoas que querem aquilo. Então você tem essas maravilhas do mundo digital, no instagram principalmente.
O algoritmo é maravilhoso e ao mesmo tempo é terrível, porque ele prende a gente em bolhas. Ao mesmo tempo que ele me faz ver coisas que eu gosto, ele me faz ver coisas que eu gosto em excesso, a ponto de não aguentar mais olhar pintura em aquarela de outras pessoas. Eu também não quero que as pessoas vejam tirinha do Téo & O Mini Mundo o dia todo, por isso que eu não posto toda hora. Uma vez ao dia, uma vez a cada dois dias. Acho que a gente tem que ter um pouco de escassez, se não cansa, por mais que as tirinhas sejam diferentes.
Vamos falar um pouco sobre o livro “Jorge” agora. Pensando na frase de que “Todo mundo conhece um Jorge”, o que mais te inspirou na criação desse personagem? O que você observou no mundo que te trouxe a ideia para essas tirinhas?
Eu tenho algumas inspirações. Uma sou eu mesmo (risos). Outra é meu pai. Ele é muito Jorge assim, muito cheio de fazer gracinha. Tem algumas coisas que estão presentes em certa categoria de pessoas da mesma idade. E é muito engraçado porque não era pra ser um livro, era pra ser uma única tirinha do Téo & o Mini Mundo, do livro três talvez. Aí postei e logo na sequência me deu uma vontade de fazer uma segunda e quando eu vi a reação das pessoas: “ah igualzinho meu pai”, “ah, meu vô é assim”, eu falei “vou fazer outra”. Fiz a outra e postei. Ai foi um sucesso maior que a primeira, fiz a terceira.
O negócio foi crescendo. E eu pensei: “vai virar um personagem próprio, vai ganhar um livro próprio”. E hoje, não tem jeito. Tem as redes sociais que espalham a nossa voz. Elas são efêmeras, uma hora vai acabar. Então eu preciso ter um backup dessas coisas, então qual é a melhor forma que eu encontro de fazer um backup? É ter uma cópia disso na casa de muitas pessoas. E como fazer isso? Fazer um livro! O bom e velho livro impresso, de papel. Então, eu não consigo mais ver esse meu trabalho de quadrinhos sem ser publicado. E o Jorge foi assim. Aí eu fiz mais um monte de tirinhas e lancei o financiamento coletivo e passou de 200%, de quase 700 pessoas, o que eu fiquei muito surpreso.
A Próxima pergunta, basicamente, você já falou um pouquinho, que era sobre essa questão do Catarse (financiamento coletivo). Então, se quiser, pode acrescentar mais detalhes sobre essa sua experiência, como foi passar por esse processo etc.
O catarse é uma ferramenta muito interessante porque ele cria uma sensação de comunidade, ele cria um engajamento, ele faz com que as pessoas se sintam parte daquilo. As pessoas apoiam e comemoram juntas quando a gente atinge a meta. Não é simplesmente tipo “ah, eba, vou receber o livro”, não. É porque elas estão ajudando e fazendo parte daquilo e essa é a vantagem de fazer um financiamento coletivo.
A segunda vantagem é você conseguir vender umas coisas que não existem no papel, que não existem fisicamente, mas que existem no mundo das ideias e que as pessoas já sabem. E só dá certo quando as pessoas já conhecem o seu trabalho previamente. Não adianta a pessoa do nada, não tem conta no instagram, não tem no facebook, não tem nada, “ninguém me conhece, vou lançar um catarse”, “vou arrecadar 40 mil reais para fazer um livro”.
Se as pessoas não conhecem o seu trabalho, vai ser muito difícil. Tanto que, tem 260 mil pessoas no instagram, 698 apoiaram. São pessoas que apenas observam. Não é porque simplesmente “ah, não tenho dinheiro”, não, é porque não teve uma motivação suficiente para apoiar o livro. Não teve engajamento, identificação, elas não se viram naquele material. Isso vale também para o Téo & o Mini Mundo. Isso vale também pro Click Plock, isso vale pra qualquer outra coisa.
Tem instagram que publica tirinhas dos outros, inclusive as minhas. Eu não acho ruim porque sempre que eles publicam tem gente que passa a conhecer o meu trabalho, e meu objetivo, mais do que vender livro é fazer com que as pessoas leiam os quadrinhos. Porque a partir da leitura desses quadrinhos, elas podem ter alguns insights que elas não tinham antes e mudar suas vidas por conta da leitura de uma simples tirinha, ou dar um sorriso naquele dia. A gente tem que construir uma relação com as pessoas.
Sabendo que em Julho tem o lançamento do livro “Jorge”, gostaria de saber mais sobre os trabalhos futuros. Você falou sobre um possível terceiro livro de Téo & o Mini Mundo também. O que você planeja em relação às suas produções?
Eu tenho uma coisa que estou fazendo, mas eu não posso divulgar ainda, que envolve Téo & O Mini Mundo, é uma surpresa, talvez para o início do segundo semestre. Dependo de algumas coisas ainda para confirmar, mas eu tenho a intenção de lançar o terceiro livro no final do ano. Eu já tenho quase a quantidade de tirinhas suficientes para fazer o terceiro livro. Falta só um pouquinho, umas cinco, pra fechar.
O que você diria pra alguém que quer começar a seguir a carreira com a criação de histórias em quadrinho?
Quando a gente acha que está pronto, não está pronto. E quando a gente acha que “agora está pronto” ainda não está, porque não existe o pronto. Tudo é uma transição. Tem uma tirinha que a Eulália fala pro Téo “Estou em uma fase de transição” , ele “para chegar aonde?”, ela “em outra fase de transição”. Tudo é uma fase de transição.
As pessoas acham que vão fazer quadrinho e no primeiro, no segundo, no terceiro quadrinho vão falar “é isso”. Não é isso, porque nada é. Pode até ser, que naquele momento é isso. Mas amanhã pode ser outra coisa. E é isso que é a graça da coisa, você não ficar preso. “Ah criei um traço. É esse estilo e vai ser assim pro resto da minha vida”. Pode ser, tudo bem. Só que o conteúdo vai ser diferente, porque você vai mudando, vai conhecendo outras realidades, você vai conseguindo repertório e vai amadurecendo com o tempo.
Então eu acho que o caminho pra quem está começando é começar, e fazer sempre. E não é fazer repetindo a primeira feitura. Faz e vai estudando. Vai ler livros de quadrinhos, veja quadrinhos dos outros. Da uma olhada, vê como é que o Jefferson Costa posiciona os quadros do Jeremias, por exemplo. Como é que ele direciona o nosso olhar? Veja como é que Laerte faz as mãos dos personagens. Esse tipo de olhar. E se puder fazer um curso de criação de quadrinhos ou vários cursos, eu acho que é o melhor caminho. Tem muita gente autodidata, mas o caminho fica mais rápido, mais curto, quando a gente estuda com a ajuda de um professor.
Eu tenho gravado alguns vídeos no YouTube, comentando as tirinhas do Jorge, falando dessas questões da disposição do balão. Eu acho bem legal, eu gosto de fazer isso. Acho que é o caminho, estudar. É meio clichê, eu fico tentando fugir do clichê em relação a estudar, mas é isso!
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