Confira a entrevista exclusiva que o escritor Cláudio Sério Alves Teixeira concedeu ao GeekPop News. Ele é promotor de justiça e concilia essa rotina com o trabalho literário. Autor de dois livros, “Miragem” (2021) e “HQ” (2024). Atenção: Alerta de spoiler e discussão de temas sensíveis como violência.

O senhor poderia se apresentar para os nossos leitores? Queremos conhecê-lo melhor!

Meu nome é Cláudio Sérgio Alves Teixeira, tenho 50 anos, sou casado e tenho três filhos. Gosto de esportes e pratico tênis, já tendo passado por muitos esportes, como xadrez e karatê. Fui professor de língua portuguesa por 19 anos, função que abandonei ao ingressar no Ministério Público de São Paulo. Sou leitor desde criança e tenho dois livros publicados, “Miragem “(2021) e “HQ” (2024). Moro em Guarulhos (SP), meu modesto labirinto.

O senhor é um promotor de justiça. Essa atividade ajuda ou auxilia de alguma forma o seu trabalho como escritor?

Não ajuda em nada. Ser promotor de justiça é uma realização pessoal, um cargo que alcancei por concurso público após muitos anos de estudo, o qual uso para o bem da sociedade. Não tem qualquer relação com minha paixão por literatura.

Como o senhor concilia uma atividade com tantas responsabilidades com a rotina de escritor?

A atividade de promotor de justiça é exaustiva, sem dúvida, especialmente no Tribunal do Júri, no qual atuo (há plenárias que começam às 9h da manhã e se estendem até a madrugada). Exatamente por isto, preciso de hobbies, ou enlouqueço. Há pessoas que correm, outras que nadam, há ainda os que cantam. Eu leio e jogo tênis!

Vamos falar do livro agora. “HQ” se passa em um bairro turbulento. Em que local o senhor se inspirou para criar esse cenário?

Capa do livro "HQ".
Crédito: Editora Labrador

Sou filho da periferia de Guarulhos, onde sempre vivi e, principalmente, lecionei. Porém, não há uma periferia específica usada como ilustração do local onde minha narrativa acontece. Antes, “HQ” se passa num lugar vago, embora seja uma soma das regiões periféricas de Guarulhos e São Paulo que conheci ao longo da vida.

O ponto de partida do livro é a morte da jovem Bianca, que acaba por se envolver em um meio com traficantes violentos. Como o senhor espera que os jovens leiam o livro e qual a mensagem?

Há décadas, desde meus tempos de magistério, tento demonstrar aos jovens que o caminho das drogas só leva à desgraça, ao infortúnio, à tristeza e, em casos extremos, à morte. Claro que não escrevo minha obra com fins pedagógicos, apenas estéticos, mas espero que a narrativa apresentada possa contribuir com exemplos do quão nefasto é o caminho da criminalidade.

O personagem Dimas sai em busca de vingança após a morte da filha? Que sentimento o senhor acha que o motivou e de que outra forma ele poderia ter agido para buscar justiça?

Dimas é um personagem muito querido para mim. Ele teve uma existência desregrada, embora muito livre. Fez o que bem entendeu de sua existência até por volta dos 40 anos, quando o assassinato da filha Bianca o faz perceber o vazio de seus dias até então. Como ele mesmo diz, se não conseguiu dar sentido à vida, talvez consiga dar sentido à morte. Ele simplesmente não suporta sua parcela de culpa na morte da vítima, então busca tanto vingá-la quanto se redimir por sua omissão paterna, embora o custo seja presumivelmente definitivo.

A relação entre Naka e Dimas é muito forte. Como esse apoio entre os personagens é importante para a narrativa? Naka teria agido de uma forma diferente se soubesse de tudo?

A história tal qual narrada só é possível por conta dessa amizade entre Naka e Dimas, dois sujeitos tão díspares quanto complementares. Dimas jamais permitia a intromissão de Naka, afinal ele sabia exatamente onde sua jornada em busca de vingança o levaria. Se Naka tivesse sabido de tudo desde o início, sua forma de narrar o livro seria outra, mas não o desfecho. Dimas estava resoluto.

Laila é uma mulher forte, mas se culpa muito pela morte do marido, mesmo após anos de relacionamento tóxico. O senhor acredita que a culpa atinge mais as mulheres?

Infelizmente, ainda há muito para avançar nas questões de igualdade de gênero. Em outros temas também, é claro. Laila se culpa por seu finado marido ser um crápula, o que é bastante comum, lamentavelmente, nas mulheres arrastadas para relacionamentos abusivos, nos quais elas se veem como responsáveis pelo comportamento dos companheiros violentos, embora sejam deles vítimas. Entretanto, ao que parece, ela conseguiu se livrar dos traumas (risos).

Karl Bergman é uma pessoa ruim, ou apenas uma pessoa que sofreu muito e guarda ressentimentos?

Karl Bergman é, como cada um de nós, uma pessoa presa às circunstâncias. No entanto, a maioria de nós não sai, por aí, tentando superar à força as vicissitudes da vida. Eu o vejo como alguém prático, um sujeito para quem os fins justificam os meios. Não é alguém por quem eu tenha simpatia, mas é um bom personagem e, sobretudo, o principal propulsor da narrativa de “HQ”. Além disso, me parece um vilão perfeito: bonito, rico, carismático e com motivações secretas.

No final do livro, Naka toma uma decisão ousada. Como o senhor imagina o futuro do personagem após o final do livro?

Tento não imaginar. Muitas pessoas me perguntam sobre o paradeiro final de Naka, com quem os leitores desenvolvem uma relação de tocante proximidade. Contudo, não importa tanto onde ele está, sim, o fato de ter decidido tomar as rédeas de sua vida e levá-la ao extremo, tal qual Dimas o fizera. Ele se cansou de treinar para viver, assim como se cansou de treinar para lutar. Sua motivação agora é ter mais intensidade em todos os aspectos de sua vida, não apenas ver os dias passarem de forma anódina, embora bastante agradável.

Muito obrigada por nos conceder essa entrevista!

Foi um prazer imenso! Feliz 2025 para todos nós.