O autor Jorge Salem busca contar uma história que é parte importante da cultura do Paraná, de acordo com as memórias do sogro. “Memórias de um Tropeiro” conta a história de João Azevedo (1925-2020), o patriarca da família que exerceu a atividade de tropeiro, entre os anos de 1948 e 1978.
No prefácio, escrito por Arnaldo Zubiroli, é explicado que, Jorge foi casado com Maura Lúcia Azevedo Salem (1963-2021). Ela morreu prematuramente, antes da publicação do livro. Ainda no prefácio, Zubiroli destaca o processo de reconstrução histórica familiar realizado pelo autor. Na introdução, João Azevedo se apresenta e fala um pouco sobre tudo que contou para o genro. Ele afirma que o objetivo é fazer com que as pessoas compreendam as atividades de um líder de comitiva. Do mesmo modo, pretende contar como se tornou o João Boiadeiro.
O que é o Tropeirismo
Antes de narrar as aventuras de João Boiadeiro, o autor faz uma retomada sobre o que foi o tropeirismo. Essa atividade começou ainda no período colonial. Uma série de cavaleiros conduzia tropas e cavalos, atravessando gado e mercadorias. Os tropeiros foram muito importantes para o desenvolvimento da economia, uma vez que essa era a principal forma de ligação dos polos econômicos do Brasil.
O Tropeirismo está ligado, desde a expansão cafeeira no século XIX, a industrialização do século XX, até a consolidação do agronegócio. João Azevedo era chefe de tropa. Dessa forma ele conduzia vários cavaleiros no caminho para levar mercadorias para comércios do Paraná, assim como para o interior de São Paulo.
O autor faz uma retomada histórica do Tropeirismo no Paraná, entre o século XVIII e XIX. Fala dos municípios como Piraí do Sul, Jaguariaíva, assim como a história do povoamento dos Campos Gerais. Apesar das localidades serem mais conhecidas por pessoas do Paraná, essa narração permite conhecer algumas características marcantes da atividade dos tropeiros, uma vez que ela também acontecia em outros lugares do Brasil.
João Azevedo ou João Boiadeiro
A partir do segundo capítulo, conhecemos a história de João Boiadeiro, narrada por ele mesmo. Ao se apresentar, ele fala de sua família, dos pais, dos irmãos, da esposa Lídia, e dos filhos que vieram depois. João deixa claro como os pais foram importante para sua formação. Desse modo, uma série de informações se revelam. O pai de João trabalhou na Estrada de Ferro, que era uma profissão comum à época.
Sua juventude, no contexto na revolução de 1930, passa por momentos como o alistamento obrigatório no exército e o início de sua vida como tropeiro. Após essa apresentação, João passa a contar histórias das suas viagens. Cada viagem é um capítulo, com um título melhor do que o outro.
É impossível narrar cada uma aqui, mas vale adiantar que cada história tem um enredo e suas particularidades. No entanto, é bom ressaltar que em determinado ponto, ele conta como é preparada uma comitiva. Desde a seleção dos homens que irão compor a tropa (segundo ele o mais importante), até a estimativa do tempo, alimentação, rota e a preparação dos animais. Isso é importante, já que um dos objetivos do livro é esclarecer como funcionavam essas comitivas.
Essas aventuras incluem viagens para outros países, geralmente os que faziam fronteiras com o Paraná, histórias da tropa e de sua própria família. Mesmo quando faz uma pausa nas atividades (1978-1981) e foi administrar uma fazenda próxima ao Rio Paraná, João trabalhou com criação de gado, o que mostra que, todo seu trabalho sempre foi voltado para essa atividade. Conforme os anos avançam, as viagens continuam. A construção cronológica facilita a compreensão do leitor sobre a biografia de João Boiadeiro.
Impressões sobre o livro
Histórias familiares podem guardar narrativas emocionantes. O protagonista da vida real é o mais interessante de todos. Sendo assim, “Memórias de um Tropeiro” cumpre seu objetivo de livro de memórias. A narração de João Azevedo contém todas as características de uma boa história, a qual gostamos de ouvir. Aprendemos como os tropeiros foram parte importante do desenvolvimento econômico do Brasil e viajamos pelas lembranças de um deles.
Talvez o melhor do livro, é que personagens e histórias surgem nos momentos mais inesperados. Como o indígena Pedro Guarani. Ele foi capturado depois que ele e seu grupo de indígenas, atacaram o pai de João e os demais funcionários da Estrada de Ferro em 1932. Pedro aprendeu a falar a língua e passou a viver na casa da família. Tempo depois, ele salvou a vida de Chico (irmão mais novo de João), quando este foi picado por uma cobra. Depois Pedro foi embora procurar sua família, mas voltou com a esposa e os filhos, e todos passaram a viver no local.
Dessa forma, ler os relatos de alguém que gostava tanto do que fazia, é ótimo. E apesar dele não estar mais aqui, sua família certamente se orgulha de sua trajetória, que agora se torna conhecida. O melhor de gostar dos personagens, é saber que eles realmente existiram. João Azevedo e todos os tropeiros merecem ser saudados. O livro é uma homenagem a todos eles.
Jorge Antônio Salem merece aplausos pela iniciativa de reunir essas memórias e transformá-las em um livro conciso e de fácil compreensão. Os capítulos são relativamente curtos e de linguagem simples. As fotografias também enriquecem o conteúdo.
Sobre o autor
Jorge Antônio Salem é farmacêutico e fiscal do Conselho Regional de Farmácia do Estado do Paraná. É escritor e já publicou dois livros desde 2021. É católico e coordena o Acampamento FAC (Formação de Adolescentes Cristãos). Foi casado com Maura Lúcia Azevedo Salem até o falecimento dela em 2021. É pai de Ana Carolina e Ana Beatriz.
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