Minha nossa…

Indiferença” é a palavra que melhor define o sentimento que permeia minha review sobre o arco de encerramento da segunda temporada de Doctor Who. Este desfecho não apenas marca o fim da temporada, mas também encerra a breve Era do 15º Doutor. Apesar das inúmeras especulações que circularam nas últimas semanas, é fato que mudanças de última hora e refilmagens foram realizadas para acomodar a regeneração. Infelizmente, o resultado final, aquém do esperado, sugere que a produção foi ajustada às pressas, o que ajuda, ainda que não justifique completamente, a qualidade medíocre apresentada.

Independentemente de ter sido ou não essa a intenção dos produtores, o fato é que, pelo segundo ano consecutivo, a série entregou um arco final decepcionante, mesmo após uma temporada consistente e, a meu ver, superior à anterior. O contexto pouco importa quando o desfecho se repete, novamente um encerramento que frustra e esvazia o impacto da jornada construída ao longo dos episódios.

Review | Doctor Who: Mundo do Desejo / A Guerra da Realidade (Wish World / The Reality War)
Imagem: Disney+ / BBC

Confesso que a motivação para redigir esta review é mínima, tamanha a decepção. Isso me impede de aprofundar a análise sobre os elementos canônicos do roteiro de Russell T. Davies ou sobre a direção de Alex Pillai nos episódios “Mundo dos Desejos” e “A Guerra da Realidade”. Destaco apenas um momento que me proporcionou genuína satisfação: o retorno de Rani em “O Festival Interestelar da Canção”. A aparição da personagem me encheu de esperança, pois parecia a oportunidade ideal para que o showrunner esclarecesse toda a confusão temporal e multiversal instaurada desde a Era do 14º Doutor, quem se lembra do “Newton indiano” e da famigerada “mavidade”?

Rani, como uma cientista movida por interesses egoístas e sem qualquer consideração pelas vidas afetadas por seus planos, seria a figura perfeita para “arrumar a casa”. Em “Mundo dos Desejos”, episódio de que até gostei, embora com ressalvas, essa possibilidade ainda parecia viável. A estética estava bem resolvida, e o roteiro abria múltiplas possibilidades narrativas. Contudo, o caminho escolhido pelo texto foi excessivamente longo e disperso, e, ao invés de um clímax sóbrio e coerente, o Finale apenas agravou os problemas.

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Aspectos técnicos e falhas narrativas

Os figurinos e a fotografia se destacam como os elementos técnicos mais bem executados deste arco, seguidos pela trilha sonora, que mantém sua qualidade habitual. No entanto, a dramaturgia sofre com um roteiro excessivamente infantilizado, especialmente na segunda parte. As decisões narrativas não resistem a uma análise crítica mínima. Um exemplo: “por que Rani não utilizou a Sra. Flood para recriar os Time Lords a partir de Omega?”

O roteiro cai em simplificações que só afastam o espectador, conduzindo à frustração. Omega, uma figura lendária, foi reduzido a um monstro caricatural, vencido de forma apressada e desprovida de impacto. A excelente atriz Archie Panjabi, que vive Rani, é desperdiçada, sendo eliminada por Omega como uma vilã genérica. Poppy, cuja concepção já era questionável desde o início, torna-se ainda mais problemática com explicações improvisadas, uma tentativa frustrada de Russell T. Davies de criar um Flashpoint próprio.

Os cameos também soam deslocados e desprovidos de propósito narrativo, em especial o da 13ª Doutora. Embora tenha conseguido me arrancar um sorriso, sua aparição foi gratuita e sem contexto claro. A referência a Susan se resume a uma citação vazia e incoerente. A birregeneração, por sua vez, recebeu uma explicação apressada e insatisfatória, como se jogada de forma improvisada no meio da trama. Conrad, personagem que poderia ter maior relevância, se limitou a ser um mero condutor de sonhos. Por fim, o processo de regeneração careceu de emoção, ganhando algum respiro apenas no momento em que o Doutor abre a porta da TARDIS e segue em direção a Joy.

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Reprodução: Disney+

A aparição de Billie Piper e a contradição final

Ainda assim, houve espaço para uma última surpresa, a aparição de Billie Piper como a possível 16ª Doutora. Não está claro se esta foi, de fato, uma regeneração ou apenas mais um truque que jamais será explicado adequadamente. Admito, com certa contradição, que essa escolha me deixou dividido. De um lado, minha admiração por Billie Piper alimenta a curiosidade e o entusiasmo para vê-la como Time Lady; de outro, meu lado crítico não consegue ignorar que esta decisão soa como uma estratégia de marketing apelativa, semelhante ao que ocorreu com David Tennant.

Desde Flux não terminava uma temporada de Doctor Who com uma sensação tão amarga e um sentimento tão profundo de indiferença em relação ao futuro da série. Se esse for o caminho que continuará sendo trilhado, sinceramente, não me oponho a um longo hiato, que, se necessário, pode durar até 2030. Neste momento, me sinto mais confortável acompanhando as produções da Big Finish, que seguem entregando narrativas mais coesas e respeitosas com o legado da série.