Voltamos a saga de Joel e Ellie

Após revisitar o aclamado The Last of Us Part I, voltei ao universo criado por Neil Druckmann e Craig Mazin com grande expectativa para a segunda temporada da série da HBO. O final marcante da primeira parte, em que Joel mente para Ellie sobre os Vaga-Lumes, continua ressoando intensamente mesmo anos depois, tanto nos jogos quanto agora, na série. Esse momento-chave é adaptado com sensibilidade e força como ponto de partida da nova temporada, dando o tom de uma narrativa que agora foca menos no vínculo afetuoso entre os protagonistas e mais em sua gradual desconstrução. E assim, começamos a segunda temporada de The Last of Us, com o episódio “Dias Futuros”.

A estreia do primeiro episódio marca uma mudança drástica na relação entre Joel e Ellie. Bem como, o salto temporal de cinco anos, com os dois vivendo agora em Jackson, Wyoming, é abrupto, e o impacto emocional desse afastamento é difícil de ignorar. A série opta por um início quase protocolar, com um roteiro simples e funcional, centrado na reorganização narrativa, apresentação de novos personagens e uma reconstrução relacional marcada por desconfiança, culpa e raiva.

Pedro Pascal entrega um Joel mais brando e vulnerável, cuja culpa transparece até nos silêncios. Bella Ramsey, por sua vez, transita com naturalidade entre os resquícios da Ellie espirituosa da primeira temporada e uma nova faceta mais rebelde e confusa. As referências culturais, como Nirvana e Pearl Jam, reforçam essa transição, conectando emocionalmente o público à turbulência interna da personagem.

Review | The Last of Us: Dias Futuros (Future Days)
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Conflitos cotidianos e dramas profundos

O roteiro acerta ao aproximar os conflitos da dupla de situações relativamente comuns, como os choques de gerações e as descobertas pessoais. Ellie, agora uma jovem adulta, incorpora uma típica postura arrogante e impulsiva, enquanto Joel enfrenta a dor de não ter vivenciado essa fase com sua filha biológica. Esse contexto familiar traz uma carga dramática profunda, que promete ser explorada com mais camadas ao longo da temporada.

Destaque também para os diálogos escritos por Craig Mazin e Druckmann, que seguem maduros e emocionalmente intensos, mesmo quando percorrem caminhos narrativos já conhecidos. Assim, a força da série continua residindo nas relações humanas e nos pequenos gestos: silêncios, olhares e explosões contidas que dizem mais do que longos discursos.

Review | The Last of Us: Dias Futuros (Future Days)
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A introdução de novos personagens como Dina (Isabela Merced) e a terapeuta Gail (Catherine O’Hara) amplia o escopo emocional da trama. Dina surge como uma presença carismática e imprevisível, enquanto Gail oferece a Joel uma possibilidade rara de introspecção, algo pouco visto nos jogos. A revelação de um evento passado entre os dois promete ser relevante e carrega um peso dramático importante.

Se há alguma crítica, ela recai sobre a montagem em alguns momentos e o ritmo desigual de certos núcleos narrativos. Ainda assim, a série valoriza a “queima lenta” e o desenvolvimento cuidadoso de seus personagens e ambientações. A direção de Craig Mazin permanece precisa e intimista, com o apoio da trilha minimalista de Gustavo Santaolalla que contribui para a atmosfera melancólica do episódio.

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Visual refinado e fidelidade estética

Review | The Last of Us: Dias Futuros (Future Days)
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Além disso, a qualidade visual da série segue como um dos grandes destaques. Desde as paisagens cobertas de neve até o design de produção detalhado, tudo remete ao cuidado visual presente nos jogos. Apesar disso, a fotografia melancólica, com sua beleza natural, reforça o tom contemplativo e sombrio do universo pós-apocalíptico retratado.

Dias Futuros também apresenta a personagem Abby (vivida por Kaitlyn Dever) e um grupo de sobreviventes ligados aos Vaga-Lumes. A escolha de revelar suas motivações logo de início difere da abordagem do segundo jogo, mas parece adequada para delimitar o novo tom da série, que se aproxima cada vez mais de temas como vingança, remorso e ódio.

Apesar do foco dramático, o horror também se faz presente, ainda que de forma contida. Há uma sequência bem dirigida que remete diretamente à jogabilidade, com o uso de elementos como garrafas para distração, ataques furtivos e ângulos que evocam a perspectiva dos games. Porém, um novo tipo de infectado é introduzido, trazendo possibilidades interessantes para os próximos episódios.

Uma estreia sólida e promissora

Review | The Last of Us 2
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Dias Futuros é um episódio de abertura sólido, que cumpre bem seu papel de reposicionar Joel e Ellie em um novo ponto de partida emocional e narrativo. Mesmo com alguns tropeços de ritmo, a reintrodução dos protagonistas é sensível e coerente, respeitando suas trajetórias e apontando para conflitos ainda mais intensos.

As novas personagens, os dramas pessoais, os sinais de tensão crescente na comunidade de Jackson e o retorno do horror como elemento visual e narrativo estabelecem uma base promissora. Por fim, o episódio prepara terreno para desdobramentos impactantes, tanto nas relações quanto nos confrontos, sem nunca perder de vista o que torna The Last of Us tão especial: a humanidade no coração do apocalipse.