Hoje é o Dia Mundial do Livro! O dia 23 de abril tornou-se um marco como instrumento de incentivar as pessoas a ler cada vez mais. No entanto, cada vez mais somos, todos, vítimas de uma rotina acelerada, cheia de compromissos. Isso compromete a qualidade do tempo que temos para ler, e por isso é cada vez mais difícil fazer uma pausa. 

Além disso, o mundo virtual anda competindo cada vez mais com o tempo real. Nesse sentido, os escritores Whisner Fraga, Vicente Humberto e Eduardo Barchiesi falam sobre a preocupação com o livro. Além disso, refletem como o objeto e como a leitura se inserem no espaço atual, será que conseguimos uma pausa na rotina para ler?

Confira a terceira reportagem especial da Semana do Livro

Whisner Fraga, Vicente Humberto e Eduardo Barchiesi | Créditos: Divulgação

O escritor mineiro Whisner Fraga expressa a importância do livro nesse ambiente cada vez mais virtual e imediatista:

O livro tem importância, neste mundo cada vez mais virtual, como um objeto físico, que ocupa espaço e é suporte para várias sensações estéticas: o cheiro, o tato, a visão, sobretudo. Manusear o artefato, sentir a textura, aproximar as páginas do nariz, folhear, examinar os detalhes da capa, as cores, os traços, todas estas interações preparam nossa consciência para uma interpretação mais acurada do mundo.

Entender o livro como algo maior do que o próprio texto é fundamental para que as pessoas pensem sempre em trocas mais profundas, não só com os sentidos e com a arte, mas também com a própria vida. O livro, um objeto duradouro, nos ajuda a questionar a fugacidade e o imediatismo do universo digital, dos relacionamentos superficiais e da transitoriedade de tudo.

Como experiência de leitura, o livro carrega consigo, de forma contundente, avassaladora e definitiva, a liberdade e a autonomia. É fundamental que se pensem as informações, os textos que chegam até nós, para não cairmos em armadilhas: é neste espaço de reflexão que a leitura nos insere, neste espaço de cidadania, de pertencimento, de escolha e de ação.

O poeta Vicente Humberto defende que o livro é uma extensão do corpo, uma matéria viva, e essencial nessa sociedade cheia de “imagens e ruídos”:

O livro-objeto é uma extensão do corpo e do silêncio. Um instrumento onde os vazios falam — não como ausência, mas como presença pulsante daquilo que não se nomeia. O livro é mais do que papel e tinta — é matéria viva. Um espaço onde o poema ganha forma para além da palavra, onde a dobra de uma página pode ser um salto, um abismo, um corte pode ser ferida, e o branco pode gritar.

O livro físico carrega sentidos na pele — no toque, na forma, no peso. Como o vazio, só se revela a quem aceita o convite do invisível. Na sociedade atual, saturada de imagens e ruídos, o livro-objeto devolve o tempo à leitura. Ele exige pausa, presença, escuta. E nisso, carrega uma delicada rebeldia: a de desacelerar o mundo com poesia. É um convite para mergulhar, tropeçar, desviar. Para se perder e se encontrar em labirintos táteis.

Por isso, acredito que os livros-objeto têm hoje uma função urgente: lembrar-nos de que a leitura é, antes de tudo, um ato poético. Um encontro com o outro, com o mundo e, sobretudo, consigo mesmo.

Para Eduardo Barchiesi, o livro causa reflexão e reforça a importância dos livros eletrônicos e audiolivros. Ele ainda ressalta a importância da interpretação por parte do leitor:

Num mundo onde abunda informação rápida e desinformada, o livro como objeto físico pode contribuir para uma experiência de leitura mais imersiva e reflexiva, sem o privilégio de exclusividade, porque hoje essa experiência pode ser compartilhada com os livros eletrônicos e os audiolivros.

Na Roma antiga e por muito tempo: Verba volant, scripta manent. Hoje, com a tecnologia eletrônica, se pode dizer também: Verba manent, scripta volant. A palavra falada pode ser gravada e reproduzida. A palavra escrita voa pela internet. O valor da experiência de interação com um texto, seja pela audição (Verba), seja pela escrita (Scripta), está na sua interpretação. Se o sentido dado for correto, a experiência terá sido valiosa.

Caso contrário, sua compreensão estará equivocada, podendo ser, em certas circunstâncias, até desastrosa. O livro como objeto físico, pela característica do suporte de seu conteúdo, possibilita que se estabeleça uma relação orgânica entre o leitor e o livro, não apenas de natureza visual, mas também tátil, no folhear das páginas, e mesmo olfativa pelo aroma nele impregnado. O ato de segurar o livro, tê-lo nas mãos, transmite sensação de posse concreta. Mas a relação visual é a que conta. 

A leitura impõe uma primeira barreira: a alfabetização. É preciso aprender a ler. Mas isso só não basta. É condição necessária, não suficiente. É preciso superar o analfabetismo funcional.

É preciso estabelecer uma interpretação da leitura que, para ser bem feita, solicita ao leitor uma imersão, um mergulho no texto. O livro de papel e tinta, dada a relação de intimidade física que pode ser estabelecida entre leitor e livro, atua como um facilitador da concentração. Mas isso só não basta. 

É preciso refletir sobre o conteúdo daquilo que se lê. A reflexão com inteligência, cultura e sabedoria leva a leitura à interpretação inteligente, culta e sábia. 

E isso depende do leitor.