Você já tentou não sentir algo? Seja medo, paixão, dor, solidão ou inveja. Por acaso, alguma vez, disseram a você que demonstrar sentimentos ou chorar era sinônimo de fraqueza? Em uma sociedade que faz de tudo para entorpecer os sentimentos, O Fabricante de Lágrimas (Fabbricante di lacrime) chega para mostrar a importância da vulnerabilidade.
Dirigido por Alessandro Genovesi (Meu casamento gay italiano) e escrito por Erin Doom, o longa italiano conta a história de Nica (Caterina Ferioli) e Rigel (Simone Baldasseroni). Ambos cresceram no orfanato Grave, onde muitas histórias eram contadas a fim de consolar crianças que tinham passado por traumas terríveis; a mais famosa entre elas era a do Fabricante de Lágrimas.
Segundo a lenda, ele era um solitário artesão responsável por criar lágrimas de cristais a partir de medos, ansiedades, angústias e, principalmente, paixões dilacerantes. Assim, todos que desejam expressar esses sentimentos por meio do choro iam à sua procura.
Contudo, aos 16 anos, Nica estava cansada de acreditar nesses contos e sentia-se pronta para viver outra vida com a nova família, longe dos horrores que passou no orfanato. Mas, o que deveria ser um recomeço, torna-se uma turbulenta aventura, visto que Rigel é adotado junto com ela. Assim, com cicatrizes similares e uma estranha conexão, eles devem enfrentar o que sentem um pelo outro.
Mistura de Clichês
Com um ar gótico à moda de Fallen, O Fabricante de Lágrimas mistura uma série de clichês românticos e narrativas já conhecidos pelo público infanto-juvenil. Muitas vezes, você achará o nosso protagonista/lonely boy incompreendido parecido com outros personagens conhecidos da cultura pop, como Edward, da saga Crepúsculo, e Hardin, o anti-herói de After.
Embora a química entre os atores seja inegável, o roteiro peca na hora de construir a intimidade entre os protagonistas. Assim, torna-se difícil para o telespectador entender o porquê eles estão perdidamente apaixonados um pelo outro. Sem esse entendimento do encontro de afetos, todas as frases bonitas, os toques roubados e os olhares penetrantes tornam-se sem sentido.
Além disso, o longa ajuda a perpetuar o pensamento infantil de que “se ele está puxando o seu cabelo, é porque gosta de você”. Assim, muitas vezes, você verá Rigel sendo bruto com Nica para “o seu bem”. Isso é explicado, de forma superficial, pelo fato de que de onde eles vieram, demonstrar qualquer tipo de sentimento positivo era sinal de fraqueza. Por isso, Margaret (Sabrina Paravicini) aplicava punições terríveis nas crianças.
Trilha sonora e cenário de O Fabricante de Lágrimas
Ao som de Budapest, de George Ezra, I Love You, de Billie Eilish, e intensas notas de piano, O Fabricante de Lágrimas mostra toda a agonia do primeiro amor. Além disso, o cenário com grandes construções arquitetônicas inserem o telespectador em um mundo que mistura a realidade com os contos de fadas.
No entanto, a tonalidade escura do filme, por vezes, se torna incômoda. O longa também está repleto de erros de continuação e furos no roteiro, levantando mais perguntas do que respostas.
Ordem, respeito e obediência
Apesar dos erros, O Fabricante de Lágrimas passa por lugares muito sensíveis. Por meio de flashbacks, vemos os maus tratos que as crianças do orfanato Grave sofreram durante anos. Assim, o longa mostra como tudo o que passamos enquanto crianças afeta o modo como nos relacionamos como adultos.
O longa também permea outros conflitos, como a perda de um filho pelo casal Milligan, o amor não correspondido de Miki e o amor possessivo de Lionel. No entanto, ele não desenvolve nenhuma dessas questões adequadamente.
Como livro, O Fabricante de Lágrimas fez um enorme sucesso, ultrapassando mais de 450 mil exemplares vendidos apenas na Itália. No entanto, a forma como o diretor adaptou a história nos faz questionar se o filme realmente era necessário ou se o amor entre Nica e Rigel deveria ter ficado apenas no formato original.